Fui ao “Chasseron” para poder tocar “La Pierre de la Paix”…
A minha relação com “Yverdon-les-Bains” iniciou quando comecei a frequentar desde há 6 meses uma formação em gestão de projetos (termina em 30.11). Essa formação foi “patrocinada” pelo Centro de Desemprego e com mérito consegui um diploma válido por 5 anos em qualquer parte do mundo, que diga-se de passagem e como tinha previsto ainda não abriu qualquer porta.
“Yverdon-les-Bains” (430 mts) fica numa das extremidades do 3º maior lago da Suiça (Lac de Neuchâtel) e todos os dias quando chego, a minha primeira visão do dia recai sobre a montanha mais alta “Le Chasseron” (1.607 mts). Desde a minha primeira visita que senti logo uma necessidade de ir lá acima. O tempo foi passando (outras voltas, outras crónicas) e agora já próximo do fim da minha formação e com o aproximar das primeiras quedas de neve, essa necessidade bateu ainda mais forte. Acho que não ia conseguir aguentar aguardar 4 meses para poder ir lá acima.
Esta volta já esteve programada para ser realizada 15 dias antes da minha última ida a Portugal (II Maratona do Gerês), mas as condições atmosféricas (chuva durante quase 3 semanas) impediram a sua concretização, pelo que no meu regresso, meti na cabeça que tinha de a realizar “custasse o que custasse” e ainda bem que assim foi, pois as fotos das cores do Outono, são qualquer coisa.
O trilho desenhado levar-me-ia de comboio desde “Yverdon-les-Bains” a “Baulmes” (634 mts) e daí iniciaria o trilho propriamente dito (BTT) até alcançar “Le Chasseron” a 1.607 mts. O regresso como sempre far-se-ia por um caminho alternativo e a ideia era apanhar novamente o comboio em “Sainte-Croix” com destino a “Yverdon-les-Bains”, o que não se veio a verificar por uma questão de 3 minutos.
Nos inícios da era glaciar enquanto toda a Suiça estava coberta de gelo (glaciares), “Baulmes” foi o primeiro local a ser habitado do cantão de “Vaud”. Os nossos amigos pré-históricos, caçadores por natureza instalaram-se numa gruta “Grotte à Barbareau” e daí em diante foi sempre a descer até à localização atual. As encostas de “Baulmes” ofereciam a proteção necessária nesses tempos (época da pedra lascada) e é um caso único na história da Suíça, uma vez que se trata da única povoação com a maior longevidade habitacional (desde 10.000 a 12.000 anos a.C.).
Quando cheguei a “Yverdon-les-Bains” e embora as previsões meteorológicas indicassem sol, o certo é que encontrei a cidade coberta de um manto de nevoeiro e nuvens escuras, sendo impossível visualizar “Le Chasseron”. Pensei para com os meus botões que a volta estava perdida porque para mim uma volta sem fotos dignas de registo não é uma volta (habituei-me ao longo da minha estadia por Terras Helvéticas a este conceito, há quem defenda outros, mas como “repórter desencartado, eheheh…” julgo ser esta a minha missão). Fiz contas à vida (monetárias e psicológicas) e o meu otimismo acabou por levar a melhor sobre o meu racional, o que se veio como sempre a verificar como tendo sido uma boa decisão.
Para atingir “Le Chasseron” atravessei uma extensa e densa floresta onde o Outono revelou toda a sua magnitude nas cores empregues. Essa floresta embora seja atravessada por um trilho pedonal deu para ser efetuada na sua quase totalidade em cima da minha fiel amiga. Esse trilho conduziu-me às “Gorges de Covatannaz” a +/- 900 mts. Enquanto deambulava pela floresta, nenhum sinal do nevoeiro, mas quando sai da mesma este mostrou que estava bem presente para me estragar o dia. Como não conseguia ver a mais de 50 mts e por medida de segurança, apliquei pela primeira vez as luzes quando entrei no asfalto. Efetuei cerca de 1 km em alcatrão e mal entrei no mato, aí a situação piorou já que a visibilidade reduziu para cerca de 30 mts (fotos falam por si).
Nestes momentos o nosso desassossego é tal que o único pensamento que nos vem à cabeça é desistir ou pensar que fica para uma próxima oportunidade, mas quem me segue sabe que quantas mais vicissitudes encontro, mais vontade tenho de as contornar e vai daí “up is the way”.
Chegado à aldeia de “Bullet” (1.200 mts) por volta das 13h00, eis que ocorre o tão desejado milagre, o nevoeiro começou a dissipar-se. Calculei que a operação levasse cerca de 30 minutos pelo que aproveitei para meter alguma coisa no bucho e admirar aquele mar de algodão que se prolongava até perder de vista (mais de 100 kms, até às montanhas de Aletsch onde se situa o maior glaciar da Suíça, ver crónica 031).
Um dos meus objetivos da viagem era poder ver e tocar a famosa “Pierre de la Paix” que fica muito próximo do “Chasseron”. Diz quem a tocou que a mesma liberta a chamada “Energia Telúrica” causadora de uma sensação de bem-estar e reposição de energias. Não sei se é verdade, pois sou fiel seguidor de São Tomé e não me perguntem se cura reumatismo e outros males.
Quando cheguei ao local e para meu espanto (não é que não estivesse à espera) encontro 3 hippies ou seja lá o que lhe quiserem chamar, dois dos quais “alapados” ao comprido a retemperarem forças. A tal energia devia estar a fazer efeito, a penetrar por locais que não vou mencionar agora, eheheh…, pois os rostos transpareciam uma grande “joy”. Dei um compasso de espera e nada, os tipos não desgrudavam, estavam mesmo a “ca..r” para a minha cena, parecia que estavam a curtir uma “trip”.
Posto isto, resolvi continuar viagem até “Le Crêt des Gouilles” (1.525 mts) no outro extremo enquanto admirava as cercanias. Como já se fazia tarde (dias mais curtos) notei que o nevoeiro começava a subir, engolindo tudo na sua passagem pelo que estava na hora de regressar a “Sainte-Croix” com vista a apanhar o comboio que me levaria a “Yverdon-les-Bains”.
Eis parte dos registos do dia… (restantes encontram-se na página
Bravos do Pelotão, ver crónica Nº035).
“Yverdon-les-Bains”, (430 mts) a 200 mts da margem. Do lado direito um dos canais que atravessa a cidade e do lado esquerdo o lago que se prolonga até Neuchâtel (afinal é o 3º maior lago da Suiça). O dia estava sombrio, completamente coberto de nuvens.
Um tag muito motivador, mas não foi esta a carruagem que me levou até ao meu ponto de partida “Baulmes”.
Capela em “Baulmes” (634 mts). Na era glaciar, esta foi a primeira aldeia habitada do cantão de “Vaud”, tendo os primeiros habitantes morado numa gruta “Grotte à Barbareau” numa destas encostas, isto enquanto toda a zona estava coberta de gelo (glaciares). Achei que o dia estava perdido no que toca a fotos, mas mais tarde deu-se o “milagre”.
Realmente esta zona era rica em cores. O Outono no seu apogeu e o melhor ainda estava para vir.
Entrada da floresta que me permite aceder às “Gorges de Covatannaz”.
A caminho das “Gorges de Covatannaz”, sempre a subir (o costume). Reparem nos tons de amarelo. Este caminho conduz-nos desde “Vuiteboeuf” até “Sainte-Croix”.
Vou passar junto aquela escarpa.
Desculpem mas tive de repetir esta foto. Em minha opinião a melhor foto desta floresta.
Aqui o Outono foi seletivo, isto é, agrupou as árvores por tons. Neste caso atravessamos a zona dos castanhos, avermelhados, alaranjados.
Acredito que dê para fazer canyoning.
Pequena queda de água. Esta floresta tinha de tudo para todos os gostos.
Uma das zonas mais delicadas do trajeto mas com alguma proteção. Nesta garganta nasce o rio que vimos em fotos anteriores.
As “Gorges de Cavatannaz” propriamente ditas a +/- 900 mts.
A floresta parecia não ter fim.
E ainda bem porque enchi as “bistas”, daí a partilha. Embora este trilho seja para caminheiros é ciclável em quase toda a sua extensão.
Se bem se recordam em “Yverdon-les-Bains” estava nevoeiro e enquanto atravessava a floresta e não tendo pontos de referência julguei que esta situação estava resolvida. Puro engano meu e aqui tive mesmo de colocar as luzinhas tanto à frente como atrás (fazem parte do meu kit de saída, ver post 239). O nevoeiro era denso mas ainda se conseguia ver a mais de 50 mts e tinha de fazer cerca de 1 km de estrada (não fosse o Diabo tecê-las ou mesmo surgirem os “chuis” e estes aqui não perdoam).
Se antes já não via grande coisa então a partir do momento que entrei no caminho de terra aí a coisa piorou (menos de 30 mts de visibilidade). Como era monte e para poupar nas pilhas, retirei os artefactos luminosos uma vez que o risco de ser atropelado era nulo.
Aqui encontro-me na aldeia de “Bullet” a 1.200 mts. O nevoeiro já era, estava feliz pois sempre iria conseguir atingir o meu objetivo e tirar bons “shots”. Agora entendem o porquê do chocolate “Milka” ser tão bom, eheheh…
O nevoeiro assemelhava-se a um mar de algodão. Este fenómeno é comum na Suíça inteira, pois constatei o mesmo quando morei na parte alemã, ou seja, tudo o que fica abaixo dos 1.000 mts fica coberto por esta nevoeirada.
Mas infelizmente ainda tinha muito que dar ao pedal. “Le Chasseron” a 1.607 mts esperava por mim.
Tinha apenas de atravessar esta floresta.
Chegada ao parque de campismo de “Les Cluds”. Aqui as caravanas ficam durante todo o inverno, daí as coberturas e aquelas pedras que se vêem por baixo servem para proteger dos animais assim como das rajadas de vento.
Ao longo da travessia da floresta (4 kms) apanhei todo o tipo de piso.
Mais do mesmo mas diferente.
Aqui aconteceu uma situação caricata. Esqueci-me do significado daquelas manchas castanhas na pastagem. Quem desejar entender o sucedido terá de ver o comentário a uma das fotos do post 183 da página 19 deste tópico.
Vim d’além.
Mas ainda tinha muito que “climbar”.
Aos 1.500 mts. Aquelas montanhas ao fundo encontram-se a cerca de 125 kms (linha reta) e já fazem parte da cadeia de montanhas visitadas aquando da caminhada no glaciar de Aletsch (post 214, pág.22).
“Le Chasseron” e o seu restaurante a 1.607 mts. Embora não pareça consegue-se pedalar em boa parte do trilho.
Por vezes temos de olhar para trás para nos darmos conta do caminho percorrido.
Outros caminhos possíveis, como sempre não faltam alternativas. Isto é a zona do “Jura”, muito mais soft que a zona do “Valais” que tanto adoro (mais agreste, rude).
No “Jura” as montanhas andam todas abaixo dos 1.800 mts e “Le Chasseron” é a 9ª montanha mais alta desta cadeia. As 4 mais altas encontram-se do lado francês. Estamos a 6 km (linha reta) da fronteira. Até chegar aqueles vultos ainda tenho de vencer quase 60 mts de desnível.
O meu périplo levar-me-á junto daquela antena ao fundo “Le Crêt des Gouilles” (1.525 mts).
Onde começa o céu?
Bom “spot” para os amantes de “BASE jumping”.
Aqui pretendia ver e sentir a famosa rocha “Pierre de la Paix”. Diz-se que quem a toca, sente uma energia forte e retempera forças para o resto do dia (mais infos em
http://www.chasseron.ch/pierre-de-la-paix.html). Neste caso não foi possível porque 3 hippies não desgrudavam do local.
Como previa, ao longo de todo o dia o nevoeiro não deu tréguas. É por isso que gosto tanto de subir.
A caminho do “Crêt des Gouilles” (1.525 mts).
“Le Chasseron” visto a partir do “Crêt des Gouilles”. Em linha reta são cerca de 1,5 km.
O nevoeiro lentamente estava a subir, engolindo tudo na sua passagem. Como os dias agora são mais curtos, resolvi que já estava na hora de regressar a “Sainte-Croix” e apanhar aí o comboio de regresso a Yverdon-les-Bains (acabei por falhar o “train” por uns míseros 3 minutos).
Na descida para “Sainte-Croix” o trilho apresentava-se bastante irregular pelo que tive de desmontar algumas vezes, daí começar a acumular um atraso em relação à hora de partida do comboio. Mesmo assim dei ao pedal e acreditem que cheguei uns míseros 3 minutos atrasado. Como o tempo de espera pelo próximo comboio iria ser longo, resolvi fazer uma competição contra mim mesmo, acabando a volta numa sessão de “spinning”. Toca a embelezar a bicla com os apetrechos luminosos (sim porque continuava o tal nevoeiro cerrado e aqui era uma estrada nacional, logo imenso trânsito nos dois sentidos). Resolvi que iria chegar a “Yverdon-les-Bains” ainda antes do comboio. Foram cerca de 17 kms na sua quase totalidade a descer (My God, que descidas!) e em que o frio mostrou as suas garras (o frio era tanto que o meu rosto ficou paralisado momentaneamente e qualquer tentativa de deitar fora a expetoração era um verdadeiro “echéc”, só faltando a mesma transformar-se em estalactites). Aposta ganha, cheguei a “Yverdon” com quase 10 minutos de antecedência.
Esta volta traduziu-se em 47 kms efetuados e +/- 1.200 mts de acumulado de subida. Foi mais uma aposta ganha uma vez que consegui realizá-la antes das primeiras quedas de neve (menos uma preocupação a azucrinar-me a moina, eheheh…). As paisagens e cores foram fantásticas, parecia que um qualquer pintor se tinha dedicado de alma e coração à sua arte.
Neste momento tenho outras preocupações pois o meu “dead line” para encontrar um novo patrocinador caminha a passos largos e sinceramente não vejo a luz ao fundo do túnel pelo que a moral anda um pouco em baixo (este Bravo também tem os seus momentos). Fiz e tenho feito tudo o que está ao meu alcance para encontrar o dito cujo, mas a sorte neste caso teima em ser madrasta.
Parafraseando o Professor Alexandrino (lembram-se dos programas do Herman), tenho de continuar a manter-me “firme e hirto como uma barra de ferro” à espera de uma morte anunciada. A ver vamos, isto porque até os doentes cancerosos em fase terminal agarram-se à ideia da cura e é isso que nos faz “keep going on”.
Cumprimentos betetistas e até à próxima crónica…
Alexandre Pereira
Um Bravo do Pelotão, neste caso sem…