Ensaio Em Detalhe:
Specialized Camber FSR Expert
Texto: Eduardo Marques
Fotos: Valentin
Vídeos: Eduardo Marques
Rider: Sérgio Almeida
Na gama da Specialized, o Cross-Country de suspensão total tem sido representado por 3 nomes: a Epic, destinada ao XC mais competitivo, a Stumpjumper FSR para um uso mais abrangente e despreocupado e a FSR XC para servir de modelo de entrada, mais simples e acessível. Com a subida da Stumpjumper para os 140 mm de curso e o desaparecimento da já "gasta" FSR XC, abriu-se uma vaga no alinhamento da marca. A novíssima Camber, proposta da marca americana para o segmento XC-Trail veio colmatar essa falha, armada com 120 mm de curso e sérias promessas de polivalência. As versões de entrada da Camber ocupam o lugar da FSR XC enquanto que os modelos mais equipados trazem capacidades semelhantes às da Stumpjumper FSR de 2009. Na semana passada deitamos as mãos a uns dos primeiros exemplares da Specialized Camber Expert, talvez a variante com melhor relação preço-equipamento, para descobrir onde estão os limites desta máquina.
[anchor="aspectos"]Aspectos Práticos e de Construção[/anchor]
Nos últimos anos, várias marcas da "primeira divisão" tem estado envolvidas numa espécie de luta silenciosa que não envolve tecnologias de suspensão, pesos ultra leves ou materiais da era espacial. Esta luta foca-se fundamentalmente no detalhe, na qualidade de construção e atenção ao pormenor. Coisas que dantes eram simplesmente considerações de última prioridade, como a passagem dos cabos, protecções, pintura e decoração, são agora merecedoras de projecto mais atento por parte dos fabricantes. A Specialized tem sido certamente uma das marcas que tem apostado forte nesta porção do design de bicicletas. E quando olhamos pela primeira vez ao vivo para a Camber, isso nota-se. Os detalhes da bicicleta são muito bem conseguidos, com pormenores integrados no design geral da máquina. Como exemplos aponto a protecção de escora e as rotas da passagem de cabo. Também os guias de cabo aparafusados que a Specialized e outras marcas tem vindo a utilizar são uma solução muito limpa para prender cabos integrais, especialmente quando comparada com o uso de abraçadeiras plásticas. A pintura tem um acabamento muito agradável ao toque e aparentemente durável.
Os elementos do sistema FSR estão bastante compactos e robustamente construídos. O balanceiro central do sistema, pintado num vermelho muito vivo, apresenta um desenho muito simples inspirado nas Epic, sempre com os habituais rolamentos selados a proteger contra a entrada de água e outras contaminações. Os eixos do sistema são de diâmetro pequeno, para reduzir o atravancamento e peso do quadro. Numa primeira análise parecem suficientes para esta bicicleta, onde não se detectou torção excessiva.
Abandonando a vista de pormenor e olhando de uma forma mais global para o quadro, encontramos uma forma muito característica da marca, com os elementos de design habituais da Specialized. O tubo inferior abaulado junto ao pedaleiro marca presença, assim como o reforço entre o tubo superior e o tubo de selim. Este reforço é uma maneira subtil que a Specialized encontrou para reduzir a altura de standover e simplificar o processo de deitar o pé ao chão zonas mais irregulares. A manipulação por hydroforming da tubagem de alumínio é levada ao extremo, com formas e curvaturas que seriam todo inimagináveis há meros 5 anos atrás mas que agora começam a marcar presença em todas a bicicletas de suspensão total desta categoria. No tubo de selim encontramos um exemplo extremo desta manipulação, com uma curvatura variável para dar apoio ao pedaleiro, ao eixo do link FSR e finalmente ao espigão de selim. Esta curvatura obriga também a que o desviador da frente seja montado no eixo pedaleiro (E-type) ao invés dos Direct Mount que se tem vindo a popularizar recentemente.
No geral, a decoração deste modelo é bastante discreta com a ausência da forte imagem de marca que durante anos pontuou a gama da Specialized. Aliás, o nome da bicicleta apenas surge gravado na zona posterior do tubo de selim, com um lettering bastante discreto e apelativo. No modelo de teste que tivemos em mão, na parte estética destoou apenas a cor verde dos autocolantes da Reba TK que parecem ter sido coordenados para resultar com a combinação de cores alternativa da Camber Expert (Verde/Preto/Cinzento) e chocam com os apontamento vermelhos deste esquema de cores. É possível que esta combinação seja devida a problemas de stock de componentes nestas fases iniciais de produção.
[anchor="fsr"]Sistema FSR[/anchor]
A história do sistema FSR (Future Shock Rear) começa não na Specialized mas sim numa pequena empresa americana chamada AMP Research. No ínicio dos anos 90, esta empresa que trabalha em vários campos da tecnologia e engenharia resolveu debruçar-se sobre o mundo inexplorado das bicicletas de suspensão total e criou uma sistema de suspensão inovador para a época. A suspensão que criaram, como quase todas os restantes, é uma evolução directa do monopivot, solução conhecida e implementada durante décadas no mundo das motas. Mas enquanto que o monopivot liga o quadro e o eixo traseiro por uma barra rígida com um pivot no quadro junto ao pedaleiro, o sistema da AMP introduziu um novo ponto de rotação entre os pivots do quadro pedaleiro e o eixo traseiro. Como resultado, o movimento da roda traseira deixou de estar condicionado a girar em torno de um pivot único e ganhou alguma independência em dois eixos. A articulação independente em que o eixo traseiro está montado é vulgarmente chamada de Horst link, tomando o nome do líder da AMP, Horst Leitner. A Specialized negociou a patente com a AMP Research e desde então tem feito monopólio do uso deste sistema nos Estados Unidos. Na Europa é comum ver outras marcas com Horst link porque a patente não se aplica cá.
Em termos de funcionamento, a Specialized afirma que o objectivo principal do FSR é isolar do quadro as forças geradas no eixo da roda traseira. Pretende-se que a suspensão trabalhe independentemente de forças de travagem, tensões de corrente e impactos. Mas como qualquer sistema de suspensão, o número dos pivots ou o nome do tipo de suspensão não nos diz nada sobre o funcionamento real. Como sempre, a dificuldade encontra-se em encontrar a geometria correcta para os elementos da suspensão traseira. As décadas de experiência que a Specialized tem no uso do FSR fazem com a sua geometria actual seja fruto de um longo processo evolutivo. O sistema presente na Camber apresenta parâmetros muito semelhantes às anteriores bicicletas de 120 mm da Specialized, com uma sensibilidade elevada e a necessidade de um sistema de plataforma para absorver as oscilações de pedalada. Enquanto que nalgumas bicicletas da marca vemos as válvulas de inércia remotas a assumir essas responsabilidades (Brain) na Camber temos um amortecedor com válvula de inércia integrada (Pro-Pedal).
[anchor="montagem"]Componentes[/anchor]
A montagem da versão "Expert" da Camber é um conjunto agradável de componentes de qualidade reconhecida. Os deveres de amortecimento da roda da frente ficam entregues a uma suspensão Rock Shox Reba TK de 120mm, uma versão OEM da Reba produzida especificamente para este modelo de bicicleta. Esta forqueta é uma versão relativamente simples da Reba, com ajuste de pressão de ar em uma só câmara, controlo de retorno e de compressão até ao bloqueio. Estas afinações são mais que suficientes para ter um comportamento muito satisfatório, mas a presença de um eixo passante (QR15 por exemplo) seria muito bem-vinda. Um amortecedor FOX Triad II localizado por debaixo do tubo superior do quadro controla o movimento do triângulo traseiro FSR.
A transmissão é uma conjugação de vários componentes Shimano de gamas diferentes, escolhidos para obter um nível interessante de performance sem deixar os custos derrapar. No capítulo dos desviadores encontramos atrás um XT Shadow de 10 velocidades que se coordena com um SLX dianteiro para trazer passagens de relação suaves e certas. Os manípulos de mudanças são também eles SLX. Esta bicicleta faz parte da primeira vaga de bicicletas de 10 velocidades a invadir os segmentos médios do mercado, uma tendência que será certamente universalizada aos restantes níveis de preço dentro de poucos anos. A Shimano faz uso desta nova gama de mudanças de 10 velocidades para alterar alguns paradigmas e usar pratos de pedaleiro com dimensões que fogem ligeiramente ao habitual nas bicicletas de BTT. O pedaleiro, uma variação específica dos Shimano Deore Hollowtech 2, vem montado com um prato grande de 42 dentes (mais pequeno que os 44 típicos das 9 velocidades) e um prato pequeno de 24 dentes (maior que a habitual "avózinha" de 22 dentes). As multiplicações baixas mantém-se semelhantes às anteriores configurações de 22 dentes no prato pequeno e 34 dentes na cassete graças ao recurso às novas cassetes de 11-36, que com o seu carreto extra de 36 dentes permite usar a avozinha de 24 dentes sem esforço adicional. O uso de pratos maiores nas mudanças mais baixas potencia também a durabilidade da transmissão, pois o desgaste dos dentes é menor, e a maior eficiência pois os ângulos de corrente são reduzidos. Para alguma informação mais detalhada neste assunto recomendo um leitura de um artigo sobre acção cordal em carretos. O único senão é um ligeiro aumento de peso que estes componentes maiores apresentam. Invertendo as atenções para o topo dos rácios, nota-se uma perda de velocidade de ponta ao ter apenas disponível o 42-11 para rolar, mas tal lacuna apenas é notada em secções de estrada ou pisos muito rolantes onde esta bicicleta não está de modo algum em casa.
A rodas são uma combinação de aros DT Swiss combinados com cubos de rolamentos selados com a marca Specialized. Nada de especial a reportar aqui, embora o uso de apenas 28 raios na roda da frente me deixe um pouco reticente. O ganho de peso em usar 32 ou até mesmo 36 raios é negligenciável (mesmo sendo rotativo) e acaba por dar sempre um bem-vindo aumento de rigidez lateral ao aro. A calçar os aros, encontramos 2 pneus The Captain em duas variantes, uma adequada a cada extremo da bicicleta. Estes pneus cumpriram a função perfeitamente, sem qualquer ocorrência de episódios de escorregamento sem aviso. O facto de serem capazes de ser montado em tubeless (2Bliss ready) acaba também por interessar a quem rapidamente pretenda remover as câmaras da ar da equação.
A governar a travagem, encontramos uns Avid Elixir 5 SL com 185 mm à frente e 165 mm atrás. Os diâmetros dos rotores são definidos pelo tamanho do quadro e assim sendo as versões L e XL vem munidas com rotores de 203 mm à frente e 185 mm atrás. De qualquer modo, no tamanho M capacidade de travagem é algo que não falta a esta máquina que mesmo sem os travões devidamente acamados (recebemos a bicicleta com 0 km) demonstrou segurança total. Ressalve-se apenas que o tacto dos Elixir é um pouco seco, com uma zona inicial do curso onde nada acontece seguida de um aumento brusco da força de travagem.
Os restantes periféricos seguem a linha caseira da Specialized. No cockpit encontramos uma combinação de guiador largo com um avanço relativamente curto. O avanço é munido, como já vem sendo comum nalguns modelos da Specialized, de um sistema de cunha interna para regular precisamente o ângulo de inclinação dentro de uma janela de 10º graus. Uma adição agradável para todos os que requerem ajustes milimétricos para se sentirem confortáveis. O selim Henge Comp, também ele uma nova proposta da Specialized para 2011, apresenta um encaixe e curvatura bastante do meu agrado, embora seja algo que cada um deverá experimentar para aferir do conforto.
[anchor="trilhos"]Nos trilhos[/anchor]
Como habitual, iniciamos esta secção com um pequeno vídeo mostrando o comportamento da bicicleta nos trilhos (seleccionar opção 720p para maior qualidade).
O primeiro contacto dinâmico com a Camber revela imediatamente que esta não é uma maquina de XC destinada a grandes empreitadas competitivas. A posição de condução, a geometria e o equipamento instalado dão à bicicleta uma personalidade mais brincalhona, demarcando-se de algumas outras concorrentes com 120 mm, que mais não são do que bicicletas de XC puro com 20 mm extra nas suspensões. A frente empinada, o guiador amplo, um standover reduzido e os travões seguros, tudo isto se combina para criar sensação de que estamos a rolar numa bicicleta altamente capaz, mas sem os componentes sobre-dimensionados a que cursos de suspensão mais elevados obrigam. Em termos de geometria e dinâmica em curva, esta bicicleta marca-nos com a sua agilidade e uma posição de condução que inspira a estabilidade. A facilidade com que altera de direcção e se deixa levar por comandos leves no guiador é marcante, sendo no entanto equilibrada.
Nas subidas, esta máquina apresenta uma pose um pouco levantada da frente que retira aquela sensação de míssil ascendente que outras bicicletas com tendência mais competitiva mostram. Mas sobe certeira e segura, pois a elevação de uma forqueta de 120 mm não é de todo suficiente para fazer levantar uma roda da frente na esmagadora maioria das subidas. Não se recusa a subir nada e fá-lo de forma muito confortável e controlada. Quando deixamos o Pro-Pedal do Fox Triad na sua posição aberta, a suspensão traseira apresenta alguma oscilação cíclica quando pedalamos mais forte. A amplitude desta oscilação não me pareceu muito incómoda e certamente serão muitos os utilizadores desta máquina que dispensarão a activação do Pro-Pedal para usufruir de uma maior sensibilidade de amortecimento em todas as situações. Obviamente que para subidas em estrada ou piso mais compacto o Pro-Pedal acaba por ser extremamente útil e actua quase como um bloqueio. Quando precisamos de manipular a transmissão Shimano somos recompensados com mudanças de relação muito rápidas e agradáveis. O novo sistema Dyna-sys 10v, pelo menos enquanto recém-saído da caixa, está em termos de qualidade funcionamento um pouco acima dos sistemas de 9 velocidades equivalentes da marca nipónica. Sendo uma reformulação bastante exaustiva das conservadoras transmissões Shimano, resta apenas aferir da durabilidade a longo prazo destes componentes de 10 velocidades. Esta é a única duvida que deixo a pairar sobre a transmissão.
Descer nesta máquina é uma proposta muito agradável. Se por um lado temos uma dinâmica de suspensão mais generosa que as bicicletas de 100 mm, por outro não temos aquele escudo de imunidade a erros que os cursos de 140, 150 e 160 mm por vezes nos parecem dar. É importante lembrar que a Reba, mesmo com 120 mm, é baseada num chassis puro de XC. E isto não é necessariamente mau pois as descidas tornam-se muito interessantes se requerem sempre um pouco de intervenção mais activa do piloto. Esta bicicleta gosta de descer, sente-se no seu meio natural alternando por zonas técnicas e rápidas, mas não esperem que ela faça tudo por vós. Há sempre um nervosismo que requer um pouco de leitura antecipada de terreno e recompensa grandemente pilotos com boa técnica. Ainda assim, a adição de um eixo passante e tudo de direcção cónica seria algo que gostaria de ver numa próxima iteração deste modelo, pois traz sempre melhorias tangíveis na precisão sem grande aumento de peso ou complexidade.
[anchor="suma"]Em suma[/anchor]
Após este contacto com a Specialized Camber Expert, fica a ideia que esta é uma máquina sólida, com materiais, tecnologias e componentes de confiança. Tal como a esmagadora maioria das bicicletas desta marca californiana, cumpre a sua função de forma exemplar e fá-lo sem arriscar demasiado em soluções alternativas. Tem um comportamento que vai de encontro ao que muita gente procura numa bicicleta de suspensão total ideal para o BTT que se pratica em Portugal. Detém uma capacidade de subida respeitável e desce de forma muito rápida e controlada. O nível de equipamento é muito actual e está bem adequado às capacidades do quadro. A Camber Expert é uma re-interpretação bem conseguida do que uma bicicleta de 120 mm deve ser, devidamente afastada das bicicletas de XC puro mas sem as desvantagens típicas de modelos com cursos mais longos.
[anchor="agradecimentos"]Agradecimentos[/anchor]
O staff do FórumBTT agradece à Specialized Portugal e à loja BikeSpace de Braga a cedência da bicicleta de teste para a realização deste ensaio.
Specialized Camber FSR Expert
Texto: Eduardo Marques
Fotos: Valentin
Vídeos: Eduardo Marques
Rider: Sérgio Almeida
Na gama da Specialized, o Cross-Country de suspensão total tem sido representado por 3 nomes: a Epic, destinada ao XC mais competitivo, a Stumpjumper FSR para um uso mais abrangente e despreocupado e a FSR XC para servir de modelo de entrada, mais simples e acessível. Com a subida da Stumpjumper para os 140 mm de curso e o desaparecimento da já "gasta" FSR XC, abriu-se uma vaga no alinhamento da marca. A novíssima Camber, proposta da marca americana para o segmento XC-Trail veio colmatar essa falha, armada com 120 mm de curso e sérias promessas de polivalência. As versões de entrada da Camber ocupam o lugar da FSR XC enquanto que os modelos mais equipados trazem capacidades semelhantes às da Stumpjumper FSR de 2009. Na semana passada deitamos as mãos a uns dos primeiros exemplares da Specialized Camber Expert, talvez a variante com melhor relação preço-equipamento, para descobrir onde estão os limites desta máquina.
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Nos últimos anos, várias marcas da "primeira divisão" tem estado envolvidas numa espécie de luta silenciosa que não envolve tecnologias de suspensão, pesos ultra leves ou materiais da era espacial. Esta luta foca-se fundamentalmente no detalhe, na qualidade de construção e atenção ao pormenor. Coisas que dantes eram simplesmente considerações de última prioridade, como a passagem dos cabos, protecções, pintura e decoração, são agora merecedoras de projecto mais atento por parte dos fabricantes. A Specialized tem sido certamente uma das marcas que tem apostado forte nesta porção do design de bicicletas. E quando olhamos pela primeira vez ao vivo para a Camber, isso nota-se. Os detalhes da bicicleta são muito bem conseguidos, com pormenores integrados no design geral da máquina. Como exemplos aponto a protecção de escora e as rotas da passagem de cabo. Também os guias de cabo aparafusados que a Specialized e outras marcas tem vindo a utilizar são uma solução muito limpa para prender cabos integrais, especialmente quando comparada com o uso de abraçadeiras plásticas. A pintura tem um acabamento muito agradável ao toque e aparentemente durável.
Os elementos do sistema FSR estão bastante compactos e robustamente construídos. O balanceiro central do sistema, pintado num vermelho muito vivo, apresenta um desenho muito simples inspirado nas Epic, sempre com os habituais rolamentos selados a proteger contra a entrada de água e outras contaminações. Os eixos do sistema são de diâmetro pequeno, para reduzir o atravancamento e peso do quadro. Numa primeira análise parecem suficientes para esta bicicleta, onde não se detectou torção excessiva.
Abandonando a vista de pormenor e olhando de uma forma mais global para o quadro, encontramos uma forma muito característica da marca, com os elementos de design habituais da Specialized. O tubo inferior abaulado junto ao pedaleiro marca presença, assim como o reforço entre o tubo superior e o tubo de selim. Este reforço é uma maneira subtil que a Specialized encontrou para reduzir a altura de standover e simplificar o processo de deitar o pé ao chão zonas mais irregulares. A manipulação por hydroforming da tubagem de alumínio é levada ao extremo, com formas e curvaturas que seriam todo inimagináveis há meros 5 anos atrás mas que agora começam a marcar presença em todas a bicicletas de suspensão total desta categoria. No tubo de selim encontramos um exemplo extremo desta manipulação, com uma curvatura variável para dar apoio ao pedaleiro, ao eixo do link FSR e finalmente ao espigão de selim. Esta curvatura obriga também a que o desviador da frente seja montado no eixo pedaleiro (E-type) ao invés dos Direct Mount que se tem vindo a popularizar recentemente.
No geral, a decoração deste modelo é bastante discreta com a ausência da forte imagem de marca que durante anos pontuou a gama da Specialized. Aliás, o nome da bicicleta apenas surge gravado na zona posterior do tubo de selim, com um lettering bastante discreto e apelativo. No modelo de teste que tivemos em mão, na parte estética destoou apenas a cor verde dos autocolantes da Reba TK que parecem ter sido coordenados para resultar com a combinação de cores alternativa da Camber Expert (Verde/Preto/Cinzento) e chocam com os apontamento vermelhos deste esquema de cores. É possível que esta combinação seja devida a problemas de stock de componentes nestas fases iniciais de produção.
A história do sistema FSR (Future Shock Rear) começa não na Specialized mas sim numa pequena empresa americana chamada AMP Research. No ínicio dos anos 90, esta empresa que trabalha em vários campos da tecnologia e engenharia resolveu debruçar-se sobre o mundo inexplorado das bicicletas de suspensão total e criou uma sistema de suspensão inovador para a época. A suspensão que criaram, como quase todas os restantes, é uma evolução directa do monopivot, solução conhecida e implementada durante décadas no mundo das motas. Mas enquanto que o monopivot liga o quadro e o eixo traseiro por uma barra rígida com um pivot no quadro junto ao pedaleiro, o sistema da AMP introduziu um novo ponto de rotação entre os pivots do quadro pedaleiro e o eixo traseiro. Como resultado, o movimento da roda traseira deixou de estar condicionado a girar em torno de um pivot único e ganhou alguma independência em dois eixos. A articulação independente em que o eixo traseiro está montado é vulgarmente chamada de Horst link, tomando o nome do líder da AMP, Horst Leitner. A Specialized negociou a patente com a AMP Research e desde então tem feito monopólio do uso deste sistema nos Estados Unidos. Na Europa é comum ver outras marcas com Horst link porque a patente não se aplica cá.
Em termos de funcionamento, a Specialized afirma que o objectivo principal do FSR é isolar do quadro as forças geradas no eixo da roda traseira. Pretende-se que a suspensão trabalhe independentemente de forças de travagem, tensões de corrente e impactos. Mas como qualquer sistema de suspensão, o número dos pivots ou o nome do tipo de suspensão não nos diz nada sobre o funcionamento real. Como sempre, a dificuldade encontra-se em encontrar a geometria correcta para os elementos da suspensão traseira. As décadas de experiência que a Specialized tem no uso do FSR fazem com a sua geometria actual seja fruto de um longo processo evolutivo. O sistema presente na Camber apresenta parâmetros muito semelhantes às anteriores bicicletas de 120 mm da Specialized, com uma sensibilidade elevada e a necessidade de um sistema de plataforma para absorver as oscilações de pedalada. Enquanto que nalgumas bicicletas da marca vemos as válvulas de inércia remotas a assumir essas responsabilidades (Brain) na Camber temos um amortecedor com válvula de inércia integrada (Pro-Pedal).
A montagem da versão "Expert" da Camber é um conjunto agradável de componentes de qualidade reconhecida. Os deveres de amortecimento da roda da frente ficam entregues a uma suspensão Rock Shox Reba TK de 120mm, uma versão OEM da Reba produzida especificamente para este modelo de bicicleta. Esta forqueta é uma versão relativamente simples da Reba, com ajuste de pressão de ar em uma só câmara, controlo de retorno e de compressão até ao bloqueio. Estas afinações são mais que suficientes para ter um comportamento muito satisfatório, mas a presença de um eixo passante (QR15 por exemplo) seria muito bem-vinda. Um amortecedor FOX Triad II localizado por debaixo do tubo superior do quadro controla o movimento do triângulo traseiro FSR.
A transmissão é uma conjugação de vários componentes Shimano de gamas diferentes, escolhidos para obter um nível interessante de performance sem deixar os custos derrapar. No capítulo dos desviadores encontramos atrás um XT Shadow de 10 velocidades que se coordena com um SLX dianteiro para trazer passagens de relação suaves e certas. Os manípulos de mudanças são também eles SLX. Esta bicicleta faz parte da primeira vaga de bicicletas de 10 velocidades a invadir os segmentos médios do mercado, uma tendência que será certamente universalizada aos restantes níveis de preço dentro de poucos anos. A Shimano faz uso desta nova gama de mudanças de 10 velocidades para alterar alguns paradigmas e usar pratos de pedaleiro com dimensões que fogem ligeiramente ao habitual nas bicicletas de BTT. O pedaleiro, uma variação específica dos Shimano Deore Hollowtech 2, vem montado com um prato grande de 42 dentes (mais pequeno que os 44 típicos das 9 velocidades) e um prato pequeno de 24 dentes (maior que a habitual "avózinha" de 22 dentes). As multiplicações baixas mantém-se semelhantes às anteriores configurações de 22 dentes no prato pequeno e 34 dentes na cassete graças ao recurso às novas cassetes de 11-36, que com o seu carreto extra de 36 dentes permite usar a avozinha de 24 dentes sem esforço adicional. O uso de pratos maiores nas mudanças mais baixas potencia também a durabilidade da transmissão, pois o desgaste dos dentes é menor, e a maior eficiência pois os ângulos de corrente são reduzidos. Para alguma informação mais detalhada neste assunto recomendo um leitura de um artigo sobre acção cordal em carretos. O único senão é um ligeiro aumento de peso que estes componentes maiores apresentam. Invertendo as atenções para o topo dos rácios, nota-se uma perda de velocidade de ponta ao ter apenas disponível o 42-11 para rolar, mas tal lacuna apenas é notada em secções de estrada ou pisos muito rolantes onde esta bicicleta não está de modo algum em casa.
A rodas são uma combinação de aros DT Swiss combinados com cubos de rolamentos selados com a marca Specialized. Nada de especial a reportar aqui, embora o uso de apenas 28 raios na roda da frente me deixe um pouco reticente. O ganho de peso em usar 32 ou até mesmo 36 raios é negligenciável (mesmo sendo rotativo) e acaba por dar sempre um bem-vindo aumento de rigidez lateral ao aro. A calçar os aros, encontramos 2 pneus The Captain em duas variantes, uma adequada a cada extremo da bicicleta. Estes pneus cumpriram a função perfeitamente, sem qualquer ocorrência de episódios de escorregamento sem aviso. O facto de serem capazes de ser montado em tubeless (2Bliss ready) acaba também por interessar a quem rapidamente pretenda remover as câmaras da ar da equação.
A governar a travagem, encontramos uns Avid Elixir 5 SL com 185 mm à frente e 165 mm atrás. Os diâmetros dos rotores são definidos pelo tamanho do quadro e assim sendo as versões L e XL vem munidas com rotores de 203 mm à frente e 185 mm atrás. De qualquer modo, no tamanho M capacidade de travagem é algo que não falta a esta máquina que mesmo sem os travões devidamente acamados (recebemos a bicicleta com 0 km) demonstrou segurança total. Ressalve-se apenas que o tacto dos Elixir é um pouco seco, com uma zona inicial do curso onde nada acontece seguida de um aumento brusco da força de travagem.
Os restantes periféricos seguem a linha caseira da Specialized. No cockpit encontramos uma combinação de guiador largo com um avanço relativamente curto. O avanço é munido, como já vem sendo comum nalguns modelos da Specialized, de um sistema de cunha interna para regular precisamente o ângulo de inclinação dentro de uma janela de 10º graus. Uma adição agradável para todos os que requerem ajustes milimétricos para se sentirem confortáveis. O selim Henge Comp, também ele uma nova proposta da Specialized para 2011, apresenta um encaixe e curvatura bastante do meu agrado, embora seja algo que cada um deverá experimentar para aferir do conforto.
Como habitual, iniciamos esta secção com um pequeno vídeo mostrando o comportamento da bicicleta nos trilhos (seleccionar opção 720p para maior qualidade).
[video=youtube;bHftayrVFnI]http://www.youtube.com/watch?v=bHftayrVFnI[/video]
O primeiro contacto dinâmico com a Camber revela imediatamente que esta não é uma maquina de XC destinada a grandes empreitadas competitivas. A posição de condução, a geometria e o equipamento instalado dão à bicicleta uma personalidade mais brincalhona, demarcando-se de algumas outras concorrentes com 120 mm, que mais não são do que bicicletas de XC puro com 20 mm extra nas suspensões. A frente empinada, o guiador amplo, um standover reduzido e os travões seguros, tudo isto se combina para criar sensação de que estamos a rolar numa bicicleta altamente capaz, mas sem os componentes sobre-dimensionados a que cursos de suspensão mais elevados obrigam. Em termos de geometria e dinâmica em curva, esta bicicleta marca-nos com a sua agilidade e uma posição de condução que inspira a estabilidade. A facilidade com que altera de direcção e se deixa levar por comandos leves no guiador é marcante, sendo no entanto equilibrada.
Nas subidas, esta máquina apresenta uma pose um pouco levantada da frente que retira aquela sensação de míssil ascendente que outras bicicletas com tendência mais competitiva mostram. Mas sobe certeira e segura, pois a elevação de uma forqueta de 120 mm não é de todo suficiente para fazer levantar uma roda da frente na esmagadora maioria das subidas. Não se recusa a subir nada e fá-lo de forma muito confortável e controlada. Quando deixamos o Pro-Pedal do Fox Triad na sua posição aberta, a suspensão traseira apresenta alguma oscilação cíclica quando pedalamos mais forte. A amplitude desta oscilação não me pareceu muito incómoda e certamente serão muitos os utilizadores desta máquina que dispensarão a activação do Pro-Pedal para usufruir de uma maior sensibilidade de amortecimento em todas as situações. Obviamente que para subidas em estrada ou piso mais compacto o Pro-Pedal acaba por ser extremamente útil e actua quase como um bloqueio. Quando precisamos de manipular a transmissão Shimano somos recompensados com mudanças de relação muito rápidas e agradáveis. O novo sistema Dyna-sys 10v, pelo menos enquanto recém-saído da caixa, está em termos de qualidade funcionamento um pouco acima dos sistemas de 9 velocidades equivalentes da marca nipónica. Sendo uma reformulação bastante exaustiva das conservadoras transmissões Shimano, resta apenas aferir da durabilidade a longo prazo destes componentes de 10 velocidades. Esta é a única duvida que deixo a pairar sobre a transmissão.
Descer nesta máquina é uma proposta muito agradável. Se por um lado temos uma dinâmica de suspensão mais generosa que as bicicletas de 100 mm, por outro não temos aquele escudo de imunidade a erros que os cursos de 140, 150 e 160 mm por vezes nos parecem dar. É importante lembrar que a Reba, mesmo com 120 mm, é baseada num chassis puro de XC. E isto não é necessariamente mau pois as descidas tornam-se muito interessantes se requerem sempre um pouco de intervenção mais activa do piloto. Esta bicicleta gosta de descer, sente-se no seu meio natural alternando por zonas técnicas e rápidas, mas não esperem que ela faça tudo por vós. Há sempre um nervosismo que requer um pouco de leitura antecipada de terreno e recompensa grandemente pilotos com boa técnica. Ainda assim, a adição de um eixo passante e tudo de direcção cónica seria algo que gostaria de ver numa próxima iteração deste modelo, pois traz sempre melhorias tangíveis na precisão sem grande aumento de peso ou complexidade.
Após este contacto com a Specialized Camber Expert, fica a ideia que esta é uma máquina sólida, com materiais, tecnologias e componentes de confiança. Tal como a esmagadora maioria das bicicletas desta marca californiana, cumpre a sua função de forma exemplar e fá-lo sem arriscar demasiado em soluções alternativas. Tem um comportamento que vai de encontro ao que muita gente procura numa bicicleta de suspensão total ideal para o BTT que se pratica em Portugal. Detém uma capacidade de subida respeitável e desce de forma muito rápida e controlada. O nível de equipamento é muito actual e está bem adequado às capacidades do quadro. A Camber Expert é uma re-interpretação bem conseguida do que uma bicicleta de 120 mm deve ser, devidamente afastada das bicicletas de XC puro mas sem as desvantagens típicas de modelos com cursos mais longos.
[anchor="ficha"]Ficha Técnica do Quadro[/anchor]
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[anchor="componentes"]Componentes da Bicicleta Testada[/anchor]
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[anchor="geometria"]Geometria[/anchor] Para o tamanho M testado:
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O staff do FórumBTT agradece à Specialized Portugal e à loja BikeSpace de Braga a cedência da bicicleta de teste para a realização deste ensaio.
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