Albergaria-a-Velha é uma povoação antiquíssima a que deu nome uma albergaria fundada por D. Teresa.
Nos alvores do Condado Portucalense, o lugar de Osseloa (hoje um bairro da vila) era residência do fidalgo Gonçalo Eriz, um dos senhores do Marnel. Foi a ele que a mãe de D. Afonso Henriques, D. Teresa, intitulando-se pela primeira vez Rainha de Portugal, deu a Carta do Couto de Osseloa pelo ano de 1117, tornando-o senhor de vastas terras com a obrigação de manter uma albergaria que ela instituía "naquele lugar ao cimo da estrada". Destinava-se, como era de uso medieval, a acudir não só aos necessitados viajantes, peregrinos para Santiago de Compostela mas também aos pobres e doentes.
Albergaria-a-Velha é um concelho que está bem no centro do país. Deste ponto até à entrada do Porto são cerca de 50 km, e até à entrada de Coimbra são outros 50 km. Era um ponto em que se encontram o norte e o sul, o norte visigótico, o norte da reconquista, o norte dos fidalgos e o sul das grandes ordens, o sul do trigo, o sul do cereal. Aqui passava a Estrada Real e era nesta região que se encontravam as duas metades de Portugal.
Estava dado o mote para a nossa aventura, uma viagem com séculos de história..
Etapa 1 - Albergaria-a-Velha > Ponte de Lima - 170 km
Partimos então na sexta feira dia 15 pelas 8h os cinco aventureiros: Pedro e João Cruz, Raúl, Paulo e André. O ponto de encontro foi o jardim frente à Camara Municipal, onde nos dias de hoje está exposta a histórica pedra da Albergaria.
Foto da Partida: Pedro Cruz, João Cruz, Raúl, Paulo e André
Seguimos em direcção à Branca, Pinheiro da Bemposta e Oliveira de Azeméis, onde pedimos o primeiro carimbo do dia nos bombeiros voluntarios.
Igreja de Oliveira de Azeméis: "Acho que está a haver missa!"
Continuamos passando por Cucujães, S. João da Madeira, Arrifana e Lourosa.
Passagem junto à igreja de Arrifana
Pequena pausa depois de uma "parede" para comer uma barra energética..
Parámos novamente em Grijó, onde encontrámos o espetacular Mosteiro de S. Salvador de Grijó. Pensámos logo em ir investigar se o pároco estaria por perto para pedir mais um carimbo. Surgiu então uma bonita acólita que nos convidou a entrar e ir visitar o claustro, sugestão a que acedemos prontamente. Visitado o templo, encontrámos o sacerdote, que não carimbou as nossas credenciais porque tinha o carimbo na casa paroquial, mas desejou-nos uma boa viagem até Santiago.
À entrada do Mosteiro de S. Salvador de Grijó
Mosteiro de S. Salvador de Grijó - Claustro
O momento cómico foi quando saimos da sacristia, naturalmente equipados de licra e nos deparámos com a igreja cheia de convidados para um casamento que iria começar dentro de alguns minutos. Confesso que não foi fácil de conter o riso.. nem o nosso nem o das meninas do coro da igreja! :mrgreen:
Como a manhã já seguia adiantada montámos nas máquinas e seguimos até Gaia.
Uma subida em Calçada Romana
Ponte D. Luis
Atravessada a ponte chegámos ao Porto, onde voltámos a parar na Sé. Qual não foi o nosso espanto quando encontrámos não só a Sé fechada mas também o Posto de Turismo. Não resisti a tirar uma foto ao horário.. Um posto de turismo que fecha aos sábados domingos e feriados? Será que não é quase como um restaurante que fecha à hora do almoço? Eram dezenas os turistas nacionais e estrangeiros que por ali andavam à nora sem poder visitar o monumento ou obter qualquer informação.. só mesmo em Portugal! :evil:
O fantástico horario de funcionamento do Turismo
No track de GPS que levava o caminho não passava sequer pela Sé e seguia para o lado dos Clérigos, mas pensei que quem o disponibilizou tivesse decidido dar uma volta alternativa pela cidade, pelo que decidimos seguir as setas que começam no largo da Sé.
As escadinhas depois da Sé
Fizemos ainda um pequeno desvio para o almoço numa bela esplanada numa travessa dos Aliados.. Estranhei o facto de o trilho não convergir com o rumo que seguimos depois do almoço, mas achámos que as setas amarelas não podiam estar erradas..
Almoço - à espera das francesinhas..
Mais tarde descobrimos que estavamos a fazer o caminho mais interior e não o caminho mais litoral que passa por Rates e Barcelos e segundo os mapas tinha mais 25 km..
Uma subidinha a pé
Uma valente subida
Ja no topo do monte
Não posso deixar de agradecer também a uns #%"$&# de uns vigias numa torre de incendios um pouco à frente deste local, numa zona em que as setas eram escassas, nos mandaram para o sitio errado propositadamente (entenda-se um caminho que seguia para um fundo de um vale).. foi pena foi terem dado à sola quando voltámos para trás!!
Encontrámos alguns km mais à frente um grupo de companheiros de Aguada (povoação uns 15 a 20 km a sul de Albergaria, já no inicio da região da bairrada) com alguns problemas na roda livre da bike. Uma vez que ninguém tinha a chave própria a única solução foi seguir assim..
Encontro com o grupo de Aguada
Em Braga era já hora de jantar e separámo-nos, uma vez que eles iam procurar alojamento e nós tinhamos mesmo que chegar a Ponte de Lima, pois já tinhamos marcado na pousada da juventude. Foi então que a viagem virou nocturno forçado, e como não tinhamos luzes (apenas de presença atrás) tivemos que seguir sempre pela estrada em grande ritmo. Eram cerca de 10 da noite quando chegámos já bastante cansados à pousada, a etapa foi muito longa! Tomar banho, jantar e cama que amanhã é outro dia! Ainda conhecemos aqui o Arturo, um espanhol que tinha começado uma viagem a solo desde a Andaluzia em bicicleta e um casal de brasileiros que iria começar no dia seguinte uma peregrinação a pé.
Etapa 2 - Ponte de Lima > Pontevedra - 90 km
Desde as 2 da manhã que percebemos que este dia ia ser longo pois chovia sem parar. Depois de alguns atrasos matinais já passava das 8:30 quando nos fizemos ao caminho sob uma forte chuvada. Nem 50 metros depois da saida da pousada, ainda estavamos a habituar-nos à chuva e já o João estava completamente ensopado, por via de uma carrinha que passou por cima de uma enorme poça de água e lhe deu um banho monumental
Logo à saida de Ponte de Lima o caminho segue por um espetacular single track com muita pedra que nos obrigou logo a andar com as bikes à mão. Mal sabiamos o que estava para vir e que teriamos muito mais etapas pedonais!
Alguns km depois iniciamos então a subida à famosa Serra da Labruja. Já tinha lido aqui no forum e em outros relatos a dureza do percurso, mas só quando lá estamos realmente é que percebemos bem a coisa.
Pedras, regos, valas, mato, uma forte inclinação e a chuva dificultaram de sobremaneira a nossa progressão, mas aos poucos conseguimos chegar ao topo, onde reencontramos o Arturo que proferia injúrias em espanhol "Quen há sido el cabron que ha echo esta ruta!?" :mrgreen:
A primeira coisa que pensei quando cheguei ao topo foi "isto agora vai ser sempre a abrir a descer". Puro engano! É que boa parte do caminho descendente também se faz à pé, como se pode ver nas fotos..
Apesar de tudo este foi para mim um dos troços mais espetaculares da viagem, sem dúvida algo unico e que marca o camiño. Estavamos já proximos de Valença.. Fizemos mais algumas paragens para tirar umas fotos e como já era era do almoço fomos tratar do assunto ainda do lado de cá da fronteira..
Entretanto o Arturo foi seguindo o seu caminho pois como é natural preferiu ir almoçar mais adiante na sua terra natal. Mais um carimbo no posto de turismo de Valença do Minho e foi então altura de atravessar a fronteira. Em Tui passamos por uma bomba de gasolina (com as inevitaveis filas de carros portugueses) aproveitamos o facto de ter lavagem automatica para dar um banho nas maquinas, que estavam completamente enlameadas e com as transmissões a queixar-se dos maus tratos a que tinham sido sujeitas..
Do lado espanhol entramos num bosque espetacular, pena é que junto ao trilho o rio não seja de águas limpidas mas sim cinza escuro..
Depois disso começaram os problemas. Eu e o João seguiamos um pouco mais a frente e parámos para tirar umas fotos e esperar pelo resto do grupo. Estranhámos a demora e pouco depois o Raúl liga-nos a dizer que estavam parados pois o suporte da bike tinha cedido. Como um mal nunca vem só, quando estávamos a combinar que esperariamos para distribuir as coisas pelas nossas bikes reparei que o meu suporte estava também quase quase a ceder. Toca a passar as coisas mais pesadas para o camelbak e outras para a bike do João e avançar até ao proximo pueblo a ver se arranjava maneira de compor a coisa. Nas primeiras casas que surgiram encontrámos um senhor muito simpático que me arranjou umas cordas para reforçar o suporte. Entretanto o resto do grupo apareceu e também já tinham conseguido remediar a situação do Raúl com uns elasticos e fita cola e seguimos caminho para Porriño.
Esta é de facto a parte mais desinteressante do camiño, pois passa na zona industrial e o resto do percurso até Redondela também não é nada de especial. Os nossos planos eram de ficar neste albergue, mas perdemos muito tempo com as avarias e como já passava das 7h (espanholas) já estava cheio, o que nos forçou a seguir até Pontevedra.
Sabia pelos relatos que tinha lido que eram pouco mais de 15 km mas muito duros, já era tarde e não havia a certeza que tinhamos lugar no próximo albergue.. As coisas estavam a ficar complicadas e foi seguir o caminho num ritmo frenético, o que me valeu uma valente inflamação nos tendoes do tornozelo. Foi pena não termos tido grande hipotese de disfrutar das paisagens na zona da Ria de Vigo, apenas tiramos 2 ou 3 fotos pois estava a ficar mesmo muito tarde, mas conseguimos chegar a tempo e felizmente havia vagas para dormir.. Reencontramos ainda o Arturo que também tinha acabado de chegar. Como os albergues fecham às 10h tivemos que ir jantar à pressa e tivemos que nos contentar com uma tortilha, uns pimentos padrones e uns bocadillos, que era a única coisa que havia para comer no tasco em frente ao albergue.. Bom, foi melhor que nada!
Etapa 3 - Pontevedra > Santiago - 60 km
O terceiro dia foi para mim o mais penoso e ao mesmo tempo o mais tranquilo. O estado do meu tornozelo não ia permitir grandes andamentos pois tinha-se agravado, acordei com o pé bastante inchado e ainda por cima a noite tinha sido mal dormida. Saimos por volta das 8h (espanholas) e a nossa previsão era de ir almoçar a Santiago. Os nossos companheiros tinham-se atrasado novamente de manha pelo que eu e o João decidimos ir calmamente tomar o pequeno almoço a uma padaria. Para além disso eles estavam mais leves uma vez que optaram por deixar os alforges no albergue..
Painel no hall de entrada do Albergue de Pontevedra
O Albergue de Pontevedra
Partimos então rumo a Caldas de Reis. As dores estavam a tornar-se extremamente incomodativas, pelo que tive que reinventar a minha forma de pedalar, pois com as sapatilhas encaixadas era quase impossivel. Encontravamos já cada vez mais peregrinos a pé, pelo que fiquei impressionado com o ritmo a que alguns seguiam.. Encontramos alguns que tinham pernoitado no albergue já a muitos km de pontevedra, parecia que iam de bike! Em Caldas de Reis nova paragem numa padaria para um cafezinho. Aproveitamos para comer mais qualquer coisa e ainda nos ofereceram um bolinho e um "shot" de sumo de laranja natural que soube mesmo bem..
Entretanto os nossos companheiros foram à frente e eu o João seguimos calmamente a disfrutar de um belo trilho em estradão com paisagens espetaculares. Parei ainda num café onde pedi um saco de gelo que trilhei entre a meia e o tornozelo a ver se as dores me davam tréguas.. A paragem seguinte foi em Padron onde nos reencontramos com o resto do grupo e tivemos que atravessar um gigantesco mercado que decorria mesmo nas ruas onde passa o camiño.. Nota ainda para um brasão colocado no topo de uma casa antiga e que traduz um pouco o que é esta aventura
Já faltava pouco para Santiago, os nossos companheiros continuaram a pedalar com força e eu e o João acabamos por seguir a um ritmo mais baixo. O que interessava mesmo era chegar e pouco importava se era meia hora antes ou depois.. Quando estavamos quase a chegar ao nosso destino mais adversidades: a corrente do João saltava e ficava trilhada entre a pedaleira e o quadro, o que nos obrigou a mais algumas paragens! Reencontramos ainda um grupo de BTTistas de Vale de Cambra com quem já nos tinhamos cruzado no dia anterior e seguimos algum tempo juntos até termos Santiago à vista!
Por estranho que pareça, ou era da alegria da chegada ou as setas amarelas e as placas desaparecem no inicio da cidade.. "E agora.. para que lado é a catedral?! Bom, o melhor é seguirmos os outros peregrinos!" Chegádos ao centro historico, acho que demos a volta maior para entrar na praça Obradoiro, mas foi fantastico ver finalmente a catedral onde os nossos familiares nos aguardavam.
Foi sem dúvida uma aventura inesquecivel que conto repetir. Talvez por um outro caminho, mas é certo que voltarei a Santiago. A titulo de curiosidade, no mesmo dia que partiamos de Albergaria, um outro grupo de BTTistas do BTT Clube de Albergaria partia de França para os 800 km do caminho francês. Pode ser que para o ano os acompanhe! Ah, e o meu suporte, tal como tinha apostado com o Raúl, aguentou até Santiago.. Fé de peregrino!? Tivemos 0 furos e 0 quedas, o que é excelente!
Encontrei esta frase num blog na altura em que andava a planear e acho que traduz muito bem aquilo que se vive nesta viagem:
“Cada peregrinação é sempre cheia de altos e baixos. Momentos bons e muito bons e momentos menos bons. Cada um desses momentos faz sempre crescer cada peregrino no conhecimento de si próprio, na sua relação com os outros, peregrinos ou habitantes de terras por onde passa."
Algumas notas para quem nunca foi e esta a pensar fazer o camiño:
- Planeiem muito bem a viagem, os pontos de paragem, contem com imprevistos e sobretudo tentem chegar cedo aos Albergues.
- Levem o minimo dos minimos de peso possivel, pois para alem de ser muito mais custoso nas subidas o alforge pode ceder.
- É imprescindivel material para manutenção da bike, fita cola, elasticos, etc..
- Sempre que as adversidades surgirem acreditem que vão conseguir, esse é o espirito do Camiño!
- Já marcaram a data?
Balanço Final: 320 km percorridos e mais de 6000m de acumulado em 2 dias e meio.
Boas pedaladas!
Nos alvores do Condado Portucalense, o lugar de Osseloa (hoje um bairro da vila) era residência do fidalgo Gonçalo Eriz, um dos senhores do Marnel. Foi a ele que a mãe de D. Afonso Henriques, D. Teresa, intitulando-se pela primeira vez Rainha de Portugal, deu a Carta do Couto de Osseloa pelo ano de 1117, tornando-o senhor de vastas terras com a obrigação de manter uma albergaria que ela instituía "naquele lugar ao cimo da estrada". Destinava-se, como era de uso medieval, a acudir não só aos necessitados viajantes, peregrinos para Santiago de Compostela mas também aos pobres e doentes.
Albergaria-a-Velha é um concelho que está bem no centro do país. Deste ponto até à entrada do Porto são cerca de 50 km, e até à entrada de Coimbra são outros 50 km. Era um ponto em que se encontram o norte e o sul, o norte visigótico, o norte da reconquista, o norte dos fidalgos e o sul das grandes ordens, o sul do trigo, o sul do cereal. Aqui passava a Estrada Real e era nesta região que se encontravam as duas metades de Portugal.
Estava dado o mote para a nossa aventura, uma viagem com séculos de história..
Etapa 1 - Albergaria-a-Velha > Ponte de Lima - 170 km
Partimos então na sexta feira dia 15 pelas 8h os cinco aventureiros: Pedro e João Cruz, Raúl, Paulo e André. O ponto de encontro foi o jardim frente à Camara Municipal, onde nos dias de hoje está exposta a histórica pedra da Albergaria.
Foto da Partida: Pedro Cruz, João Cruz, Raúl, Paulo e André
Seguimos em direcção à Branca, Pinheiro da Bemposta e Oliveira de Azeméis, onde pedimos o primeiro carimbo do dia nos bombeiros voluntarios.
Igreja de Oliveira de Azeméis: "Acho que está a haver missa!"
Continuamos passando por Cucujães, S. João da Madeira, Arrifana e Lourosa.
Passagem junto à igreja de Arrifana
Pequena pausa depois de uma "parede" para comer uma barra energética..
Parámos novamente em Grijó, onde encontrámos o espetacular Mosteiro de S. Salvador de Grijó. Pensámos logo em ir investigar se o pároco estaria por perto para pedir mais um carimbo. Surgiu então uma bonita acólita que nos convidou a entrar e ir visitar o claustro, sugestão a que acedemos prontamente. Visitado o templo, encontrámos o sacerdote, que não carimbou as nossas credenciais porque tinha o carimbo na casa paroquial, mas desejou-nos uma boa viagem até Santiago.
À entrada do Mosteiro de S. Salvador de Grijó
Mosteiro de S. Salvador de Grijó - Claustro
O momento cómico foi quando saimos da sacristia, naturalmente equipados de licra e nos deparámos com a igreja cheia de convidados para um casamento que iria começar dentro de alguns minutos. Confesso que não foi fácil de conter o riso.. nem o nosso nem o das meninas do coro da igreja! :mrgreen:
Como a manhã já seguia adiantada montámos nas máquinas e seguimos até Gaia.
Uma subida em Calçada Romana
Ponte D. Luis
Atravessada a ponte chegámos ao Porto, onde voltámos a parar na Sé. Qual não foi o nosso espanto quando encontrámos não só a Sé fechada mas também o Posto de Turismo. Não resisti a tirar uma foto ao horário.. Um posto de turismo que fecha aos sábados domingos e feriados? Será que não é quase como um restaurante que fecha à hora do almoço? Eram dezenas os turistas nacionais e estrangeiros que por ali andavam à nora sem poder visitar o monumento ou obter qualquer informação.. só mesmo em Portugal! :evil:
O fantástico horario de funcionamento do Turismo
No track de GPS que levava o caminho não passava sequer pela Sé e seguia para o lado dos Clérigos, mas pensei que quem o disponibilizou tivesse decidido dar uma volta alternativa pela cidade, pelo que decidimos seguir as setas que começam no largo da Sé.
As escadinhas depois da Sé
Fizemos ainda um pequeno desvio para o almoço numa bela esplanada numa travessa dos Aliados.. Estranhei o facto de o trilho não convergir com o rumo que seguimos depois do almoço, mas achámos que as setas amarelas não podiam estar erradas..
Almoço - à espera das francesinhas..
Mais tarde descobrimos que estavamos a fazer o caminho mais interior e não o caminho mais litoral que passa por Rates e Barcelos e segundo os mapas tinha mais 25 km..
Uma subidinha a pé
Uma valente subida
Ja no topo do monte
Não posso deixar de agradecer também a uns #%"$&# de uns vigias numa torre de incendios um pouco à frente deste local, numa zona em que as setas eram escassas, nos mandaram para o sitio errado propositadamente (entenda-se um caminho que seguia para um fundo de um vale).. foi pena foi terem dado à sola quando voltámos para trás!!
Encontrámos alguns km mais à frente um grupo de companheiros de Aguada (povoação uns 15 a 20 km a sul de Albergaria, já no inicio da região da bairrada) com alguns problemas na roda livre da bike. Uma vez que ninguém tinha a chave própria a única solução foi seguir assim..
Encontro com o grupo de Aguada
Em Braga era já hora de jantar e separámo-nos, uma vez que eles iam procurar alojamento e nós tinhamos mesmo que chegar a Ponte de Lima, pois já tinhamos marcado na pousada da juventude. Foi então que a viagem virou nocturno forçado, e como não tinhamos luzes (apenas de presença atrás) tivemos que seguir sempre pela estrada em grande ritmo. Eram cerca de 10 da noite quando chegámos já bastante cansados à pousada, a etapa foi muito longa! Tomar banho, jantar e cama que amanhã é outro dia! Ainda conhecemos aqui o Arturo, um espanhol que tinha começado uma viagem a solo desde a Andaluzia em bicicleta e um casal de brasileiros que iria começar no dia seguinte uma peregrinação a pé.
Etapa 2 - Ponte de Lima > Pontevedra - 90 km
Desde as 2 da manhã que percebemos que este dia ia ser longo pois chovia sem parar. Depois de alguns atrasos matinais já passava das 8:30 quando nos fizemos ao caminho sob uma forte chuvada. Nem 50 metros depois da saida da pousada, ainda estavamos a habituar-nos à chuva e já o João estava completamente ensopado, por via de uma carrinha que passou por cima de uma enorme poça de água e lhe deu um banho monumental
Logo à saida de Ponte de Lima o caminho segue por um espetacular single track com muita pedra que nos obrigou logo a andar com as bikes à mão. Mal sabiamos o que estava para vir e que teriamos muito mais etapas pedonais!
Alguns km depois iniciamos então a subida à famosa Serra da Labruja. Já tinha lido aqui no forum e em outros relatos a dureza do percurso, mas só quando lá estamos realmente é que percebemos bem a coisa.
Pedras, regos, valas, mato, uma forte inclinação e a chuva dificultaram de sobremaneira a nossa progressão, mas aos poucos conseguimos chegar ao topo, onde reencontramos o Arturo que proferia injúrias em espanhol "Quen há sido el cabron que ha echo esta ruta!?" :mrgreen:
A primeira coisa que pensei quando cheguei ao topo foi "isto agora vai ser sempre a abrir a descer". Puro engano! É que boa parte do caminho descendente também se faz à pé, como se pode ver nas fotos..
Apesar de tudo este foi para mim um dos troços mais espetaculares da viagem, sem dúvida algo unico e que marca o camiño. Estavamos já proximos de Valença.. Fizemos mais algumas paragens para tirar umas fotos e como já era era do almoço fomos tratar do assunto ainda do lado de cá da fronteira..
Entretanto o Arturo foi seguindo o seu caminho pois como é natural preferiu ir almoçar mais adiante na sua terra natal. Mais um carimbo no posto de turismo de Valença do Minho e foi então altura de atravessar a fronteira. Em Tui passamos por uma bomba de gasolina (com as inevitaveis filas de carros portugueses) aproveitamos o facto de ter lavagem automatica para dar um banho nas maquinas, que estavam completamente enlameadas e com as transmissões a queixar-se dos maus tratos a que tinham sido sujeitas..
Do lado espanhol entramos num bosque espetacular, pena é que junto ao trilho o rio não seja de águas limpidas mas sim cinza escuro..
Depois disso começaram os problemas. Eu e o João seguiamos um pouco mais a frente e parámos para tirar umas fotos e esperar pelo resto do grupo. Estranhámos a demora e pouco depois o Raúl liga-nos a dizer que estavam parados pois o suporte da bike tinha cedido. Como um mal nunca vem só, quando estávamos a combinar que esperariamos para distribuir as coisas pelas nossas bikes reparei que o meu suporte estava também quase quase a ceder. Toca a passar as coisas mais pesadas para o camelbak e outras para a bike do João e avançar até ao proximo pueblo a ver se arranjava maneira de compor a coisa. Nas primeiras casas que surgiram encontrámos um senhor muito simpático que me arranjou umas cordas para reforçar o suporte. Entretanto o resto do grupo apareceu e também já tinham conseguido remediar a situação do Raúl com uns elasticos e fita cola e seguimos caminho para Porriño.
Esta é de facto a parte mais desinteressante do camiño, pois passa na zona industrial e o resto do percurso até Redondela também não é nada de especial. Os nossos planos eram de ficar neste albergue, mas perdemos muito tempo com as avarias e como já passava das 7h (espanholas) já estava cheio, o que nos forçou a seguir até Pontevedra.
Sabia pelos relatos que tinha lido que eram pouco mais de 15 km mas muito duros, já era tarde e não havia a certeza que tinhamos lugar no próximo albergue.. As coisas estavam a ficar complicadas e foi seguir o caminho num ritmo frenético, o que me valeu uma valente inflamação nos tendoes do tornozelo. Foi pena não termos tido grande hipotese de disfrutar das paisagens na zona da Ria de Vigo, apenas tiramos 2 ou 3 fotos pois estava a ficar mesmo muito tarde, mas conseguimos chegar a tempo e felizmente havia vagas para dormir.. Reencontramos ainda o Arturo que também tinha acabado de chegar. Como os albergues fecham às 10h tivemos que ir jantar à pressa e tivemos que nos contentar com uma tortilha, uns pimentos padrones e uns bocadillos, que era a única coisa que havia para comer no tasco em frente ao albergue.. Bom, foi melhor que nada!
Etapa 3 - Pontevedra > Santiago - 60 km
O terceiro dia foi para mim o mais penoso e ao mesmo tempo o mais tranquilo. O estado do meu tornozelo não ia permitir grandes andamentos pois tinha-se agravado, acordei com o pé bastante inchado e ainda por cima a noite tinha sido mal dormida. Saimos por volta das 8h (espanholas) e a nossa previsão era de ir almoçar a Santiago. Os nossos companheiros tinham-se atrasado novamente de manha pelo que eu e o João decidimos ir calmamente tomar o pequeno almoço a uma padaria. Para além disso eles estavam mais leves uma vez que optaram por deixar os alforges no albergue..
Painel no hall de entrada do Albergue de Pontevedra
O Albergue de Pontevedra
Partimos então rumo a Caldas de Reis. As dores estavam a tornar-se extremamente incomodativas, pelo que tive que reinventar a minha forma de pedalar, pois com as sapatilhas encaixadas era quase impossivel. Encontravamos já cada vez mais peregrinos a pé, pelo que fiquei impressionado com o ritmo a que alguns seguiam.. Encontramos alguns que tinham pernoitado no albergue já a muitos km de pontevedra, parecia que iam de bike! Em Caldas de Reis nova paragem numa padaria para um cafezinho. Aproveitamos para comer mais qualquer coisa e ainda nos ofereceram um bolinho e um "shot" de sumo de laranja natural que soube mesmo bem..
Entretanto os nossos companheiros foram à frente e eu o João seguimos calmamente a disfrutar de um belo trilho em estradão com paisagens espetaculares. Parei ainda num café onde pedi um saco de gelo que trilhei entre a meia e o tornozelo a ver se as dores me davam tréguas.. A paragem seguinte foi em Padron onde nos reencontramos com o resto do grupo e tivemos que atravessar um gigantesco mercado que decorria mesmo nas ruas onde passa o camiño.. Nota ainda para um brasão colocado no topo de uma casa antiga e que traduz um pouco o que é esta aventura
Já faltava pouco para Santiago, os nossos companheiros continuaram a pedalar com força e eu e o João acabamos por seguir a um ritmo mais baixo. O que interessava mesmo era chegar e pouco importava se era meia hora antes ou depois.. Quando estavamos quase a chegar ao nosso destino mais adversidades: a corrente do João saltava e ficava trilhada entre a pedaleira e o quadro, o que nos obrigou a mais algumas paragens! Reencontramos ainda um grupo de BTTistas de Vale de Cambra com quem já nos tinhamos cruzado no dia anterior e seguimos algum tempo juntos até termos Santiago à vista!
Por estranho que pareça, ou era da alegria da chegada ou as setas amarelas e as placas desaparecem no inicio da cidade.. "E agora.. para que lado é a catedral?! Bom, o melhor é seguirmos os outros peregrinos!" Chegádos ao centro historico, acho que demos a volta maior para entrar na praça Obradoiro, mas foi fantastico ver finalmente a catedral onde os nossos familiares nos aguardavam.
Foi sem dúvida uma aventura inesquecivel que conto repetir. Talvez por um outro caminho, mas é certo que voltarei a Santiago. A titulo de curiosidade, no mesmo dia que partiamos de Albergaria, um outro grupo de BTTistas do BTT Clube de Albergaria partia de França para os 800 km do caminho francês. Pode ser que para o ano os acompanhe! Ah, e o meu suporte, tal como tinha apostado com o Raúl, aguentou até Santiago.. Fé de peregrino!? Tivemos 0 furos e 0 quedas, o que é excelente!
Encontrei esta frase num blog na altura em que andava a planear e acho que traduz muito bem aquilo que se vive nesta viagem:
“Cada peregrinação é sempre cheia de altos e baixos. Momentos bons e muito bons e momentos menos bons. Cada um desses momentos faz sempre crescer cada peregrino no conhecimento de si próprio, na sua relação com os outros, peregrinos ou habitantes de terras por onde passa."
Algumas notas para quem nunca foi e esta a pensar fazer o camiño:
- Planeiem muito bem a viagem, os pontos de paragem, contem com imprevistos e sobretudo tentem chegar cedo aos Albergues.
- Levem o minimo dos minimos de peso possivel, pois para alem de ser muito mais custoso nas subidas o alforge pode ceder.
- É imprescindivel material para manutenção da bike, fita cola, elasticos, etc..
- Sempre que as adversidades surgirem acreditem que vão conseguir, esse é o espirito do Camiño!
- Já marcaram a data?
Balanço Final: 320 km percorridos e mais de 6000m de acumulado em 2 dias e meio.
Boas pedaladas!