Havia já algum tempo que eu e o Abílio queríamos ir a Vila Pouca de Aguiar. Convocatórias de última hora feitas, mas ninguém estava disponível. Desenhei o trilho no Google Hearth e lá fui sozinho.
Às 8 h estava em Vila Pouca e a primeira dificuldade foi encontrar um café aberto. Depois de tomado o imprescindível café, estava na hora de preparar o equipamento. Segunda dificuldade, pneu da frente vazio e válvula bloqueada. Lá fui ter a um posto de abastecimento onde pedi um alicate e resolvi a questão.
8:50 h - Hora de partir. Embora em pleno Julho decidi levar o impermeável e ainda bem que o fiz. Os primeiros quilómetros à saída de Vila Pouca são realmente muito bonitos, com mata densa e com boa inclinação. Embora tivesse o trilho essencialmente em terra, decidi não arriscar (muito) e fiz os primeiros 6 quilómetros a subir em estrada, embora tivesse no meu raio de visão, o trilho marcado no GPS.
Chegado ao topo da Serra da Padrela a dificuldade era escolher os trilhos. Lá optei por um à esquerda e fiz uma boa parte da encosta norte da serra. A minha companhia nessa altura eram as aves de rapina e borboletas. Esta parte tem belíssimos trilhos, alguns rolantes, boas subidas e boas descidas.
Chegado ao topo (Eólicas e central da PT), passei a estrada para reencontrar o trilho e passados cerca de 2 quilómetros, grande susto. Um cão pastor, a fazer o seu trabalho, veio ao meu encontro (Amaral, lembrei-me do que me contaste do Alentejo). Acho que a velocidade máxima que registei (53 km/h) foi ali, a subir. Ainda tem a imagem de um cão enorme, com coleira de picos a rosnar ao lado do meu pedal esquerdo. UFA.
O resto foi pura descoberta, nos locais mais inóspitos onde estávamos eu, a bicicleta e o GPS. Por 3 vezes escolhi mal o trilho, desci e depois tive que subir, mas entretanto registei duas histórias fantásticas.
Em Curros, uma das aldeias por onde passei, veio um senhor ter comigo e perguntou:
- Está a ver os peixes?
- Não, estou a tirar umas fotografias. Mas aqui há peixes?
- Havia trutas, mas um pescador de Murça leva tudo. Pesca com morcões. Sabe o que são morcões?
- Claro que sei o que são morcões.
- É ilegal, mas ele compra para ai um quilo e às vezes estão 20 pescadores e só o de Murça é que pesca.
Moral da história o de Murça e os morcões fazem uma dupla implacável.
Mais à frente, entro noutra aldeia, cujo nome não registei, e vi um casal de idosos a quem perguntei onde podia encontrar água. A senhora disse:
- Bata ai nesse portão azul que a senhora dá-lhe água.
O senhor disse logo:
- Não bata nada que a senhora está a dormir. Venha daí que eu dou-lhe água.
Ao descer a rua perguntou:
- Os outros demoram?
- Não há mais ninguém, sou só eu.
Haviam de ver a cara de espanto do homem.
- Noutro dia eram para aí uns 30. Até tinham motas
Depois de se certificar que era realmente só eu, disse.
- Olhe, não quer antes um copo de vinho.
São duas histórias simples, que nos enriquecem, e quebram a rotina daquelas populações.
Depois foi tempo de chegar ao sopé da serra de Sta. Comba por volta das 15:00 h com 60 kms percorridos, outro tanto para voltar e um tempestade ameaçadora. Decidi “abortar a missão” e voltar por estrada, o que se revelou acertado mas ainda assim duríssimo, pois foram 25 kms a subir debaixo de chuva e vento contrário.
Em resumo, foi um dia bem passado que deixa vontade de lá voltar.