La Ruta de Los Conquistadores 2006

Ludos

Benevolent dictator for life
Staff member
Como já seria de esperar, já existem informações sobre este "evento" que para mim é um sonho que espero ter capacidades para alcançar (um dia) em http://www.adventurerace.com/eng/english.htm

Tudo muito espectacular, intenso e deslumbrante, mas até aqui nada de novo.

A grande novidade, é que este ano temos motivos de orgulho, ah pois é!

Vamos ter lá pelo menos, dois grandes tugas :mrgreen:

E são eles o Aldo Cardoso, esse ilustre desconhecido que aqui por estas bandas é o card050, e o João Marinho, outro ilustre desconhecido da competição (cá no fórum é Joao BTT).

Portanto nos dias 3, 4 e 5 de Novembro, vou torcer por estes dois heróis nacionais (se os coxos da bola o são, para mim estes são mais :mrgreen:) para que tudo lhes corra o melhor possível, e cheguem cá com muitas histórias para contar.


Entretanto aproveito para lançar a dica :mrgreen: , como devem calcular, não é uma aventura muito acessivel finaceiramente e os homens estão à procura de malta amiga que os patrocinem e ajudem. Infelizmente não tenho nenhuma empresa, nem o fórum gera receitas que possibilitem o apoio dos homens, mas sei que anda por aí pessoal cheio de boa vontade, capazes de ajudar estes dois companheiros do pedal, e não é forçosamente apenas ajuda financeira.

Julgo que até lá, tanto o Aldo como o João, devem manifestar-se neste tópico e apresentarem informações mais concretas, planos, e espero inclusive que nos proporcionem com alguns relatos pré-ruta e pós ruta.

Dias 3,4 e 5 de Novembro já que é altamente improvável que esteja na costa rica (senão ia lá esgalhar umas fotos e tratar da logistica :p ) , o meu orgulho vai estar nestes dois companheiros.
Até lá, se não puderem ajudar de outra forma, incentivem-nos com palavras.

Força Aldo e João :wink:

Boas pedaladas e muita força e determinação.

Um abraço
 

OBiklas

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card050 deixa-lá as noitadas e começa a dar ao pedal!! :yeah:

A malta do Biklas apoia o card050!! Força!! e não te esqueças de levar o Bidon cheio de tintinho!! :rotfl:
 

Cardoso

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sim, Card050(Aldo) e João Marinho estamos convosco, e não somos só nós visto que são dos 1º's 3 portugueses a ir fazê-la. :shock: Vão ter muito que pedalar para conseguir ACABAR :shock:, principalmente o Card050 :rotfl: :lol:
 
Apesar de não poder dar apoio financeiro dou apoio moral :D
Força para esse grande desafio (e olhem que não me importava nada de ir com voçes, acho a Costa Rica um pais lindo e esta travessia um mimo), e que tudo vos corra bem.
Depois quero um relato das provas e uma fotos que consigam tirar (se tiverem tempo :twisted:).

Um abraço e vão dando noticias.
 
Penso não serem os 1ºs portugueses a fazerem-na, além do homem da Ciclonatura "Malvar" há também uma equipa brasileira "Team Imigrantes" que conta com um português que já por lá passou. Todavia é sem dúvida uma aventura de sonho e saúde e sorte aos companheiros que lá forem.
 

João Marinho

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Relato da participação na prova por parte de Antonio Malvar

A mais dura prova de BTT do mundo

Este é o relato da minha participação na 11ª edição da ´´La Ruta de los Conquistadores´´ nos dias 14 15 e 16 de Novembro de 2003. Muito do que descrevo a seguir não consegue transmitir as emoções vividas nestes três dias. Mas este relato serve para não deixar esquecer esta vivência na Costa Rica, naquela que passou a ser a prova mais de BTT do mundo.

Desde que nasci que tenho vindo a acumular defeitos de personalidade e um deles é não saber dizer ´´não’’ a um desafio. Há cerca de um ano o meu amigo José Maria formulou-me o convite para alinhar com ele numa prova de BTT do tipo endurance que se realizava na Costa Rica. Seriam 480Km em três dias com um total de desnível acumulado de mais de 10.000 m e claro não pude ficar indiferente. Pouco tempo depois dei por mim a enviar a ficha da inscrição por internet e a fazer o pagamento dos 600USD da inscrição (não reembolsáveis). Era pois definitivo, ia mesmo participar. Os meses foram passando e a prova foi caindo no esquecimento, o que significou que descorei a preparação. Confesso que nunca dei muito credito aquilo de ser uma das provas mais duras do mundo, achei que era a Organização à boa maneira da América Latina a ‘’pintar a manta’’.
Finalmente numa quarta-feira do final de Outubro um corrirer de uma agência de viagens veio entregar-me em mão as passagens aéreas para a Costa Rica e aí percebi que já não havia retrocesso.., e mais uma vez reflecti sobre aquele meu defeito de personalidade. Pensei: ´´estou feito’’..
A participação portuguesa na prova era composta por sei elementos: eu , o José Maria, o Ricardo Melo e o Joaquim Pinto Lima como atletas e a Berta (a minha eterna companheira) e a Carla (Ricardo’s) como acompanhantes.
Resolvemos partir com alguns dias de antecedência para aclimatizar. Em boa hora o fizermos, pois a brutal humanidade tornava o ar quase irrespirável e punha-nos a transpirar só de subir um pequeno lanço de escadas.

TREINO PREVIO

Foi precisamente para nos habituarmos á realidade da prova que três dias antes da mesma resolvermos ir fazer um pequeno troço da 1ª etapa até ao primeiro Posto de Controlo situado na aldeia de Bijagual, ou seja nos primeiros 20km da Ruta. Nesse momento, as duvidas desvaneceram-se por completo: nunca na minha vida de bttista tinha visto semelhante dureza de percurso o suor escorria-me em bica pela ponta do nariz punha a roupa completamente ensopada, tudo isto em apenas meia hora. Olhei para altímetro do GPS e fiz as minhas contas, tínhamos subido 550 m de desnível ao deslocar-nos 2.3km era um record pessoal.

Completamente esgotado, uma profunda tristeza apoderou-se de mim. Sentia que não tinha qualquer hipótese de completar sequer a 1ª etapa já que teria 130km daqula cruel realidade . Mais as minhas suspeitas confirmaram-se quando no briefing na noite anterior da corrida, ouvi o director da prova, Roman Urbina, dizer que a primeira etapa seria muito fácil ate ao CP1 e que só apartir de daí é que as coisas iriam aquecer e começaria verdadeiramente a ´´Ruta de los Conquistadores’’. Quase ninguém naquela sala se apercebeu do teor daquelas palavras. Quando nessa noite deitei a cabeça na almofada estava muito apreensivo e segredei á Berta ‘’não vou conseguir’’.
Outra fase do briefering repetia-se na minha mente quem conseguir terminar a 1ª etapa tem muitas hipóteses de terminar La Ruta. ‘’ Se ao menos eu conseguir gerir o esforço…

1ª Etapa – JACO – CUIDAD CÓLON

Para uma partida ás 5h da manha, impunha-se um despertar ás 3h da madrugada e pequeno almoço ás 4h. Eram 4h45 ainda noite e já os 350 atletas se concentravam para a partida em frente ao hotel Best Western, em Jaco, cidade paraíso se surfistas nas costa do Pacifico. A partida que não se fez senão ás 5h.30 com os primeiros raios de luz da manha húmida mas sem chuva desde sempre Verão tropical na Costa Rica. Toda aquela mole humana húmida de um extraordinário colorido desapareceu num ápice para se enfiar no interior da ‘’Rain Forest’’ como aqui é conhecida a selva a selva tropical. As emoções do momento embebedaram-me o cérebro …Tinha prometido a mim mesmo que não iria entusiasmaria na partida, iria me concentrar na gestão do esforço. Sabia o que me esperava. Na parte incial da subida, quando ainda pedalava, olhei por momentos á minha volta e a meu lado vi o Bert Wolfs um atleta aleijado que so tem uma perna e que pedalando só com o crank esquerdo cá estava na Ruta pela quarta vez. Do outro lado passava por um casal num tandem e, momentos mais a frente passei por um atleta que era maneta . Dei por mim a pensar em quão afortunado eu era por não ter nenhuma daquelas limitações. Estas personagens e a sua tenacidade e determinação foram galvanizantes da minha motivação. Mal tínhamos começado a parte mais dura da ainda ciclavel subida, passou por mim o único atleta em prova com uma single-speed e pensei: ‘’eu que sou um fã de single-speed s que tenho uma há três anos jamais teria a coragem de alinhar numa prova destas com tal engenho’’ . Não consigo sequer imaginar o auto-flagelo suplementar que isso acarretaria.

Cheguei ao CP1 e sentia como esperava arrasado. Tinha feito já alguns quilómetros a pé e a ficar com bolhas nos pés de andar numa prova de BTT não estava nas minhas previsões. Agora tinha dificuldade em por o pé esquerdo no chão. Neste CP devorei avidamente imensa fruta (ananás, bananas, papaias, etc,) que a Organização punha ao nosso dispor. Bebi imensa água e decidi ir em frente ate porque me envergonhou dizendo que algumas mulheres tinham já passado há muito por ali. ‘’E então?’’ – respondi-lhe.
Felizmente que os primeiros quilómetros desta 2ª secção eram feitos num estradão de bom piso mas em breve estávamos a entrar nos horrores dos trilhos da selva tropical. Eram intermináveis linhas de agua envolvidas numa vegetação muito densa e alta onde a luz quase não penetrava. Embora não estivesse a chover, tudo era molhado á nossa volta, sob os nossos pés de um espesso manto de lama numa argamassa com pedras e folhagem seca grandes arvores caídas no trilho. Subidas com troços a ‘‘4patas’’ aqui ali, descidas abruptas onde ensaiar montar a bicicleta pode ditar um monumental escorregão, enfim o menu completo tal como prometido.
Tínhamos um tempo máximo de 4horas para fazer esta secção de 17km de extensão, levei 2h45m, e quando cheguei ao CP2 estava exausto, mas pela primeira vez senti uma leve esperança em conseguir, tinha passado pelo inferno e sobrevivido com alguma folga.
Olhei de novo pró GPS, agora para verificar o acumulado de altitudes e vi 1735m e tínhamos feito pouco mais de 38km desde o início de Jaco, fiz rapidamente as contas e foi fácil concluir que para 4100 m de total de acumulado na etapa muitas subidas ainda teria pela frente. Decidi de uma vez por todas bloquear todos os meus pensamentos e concentrar-me exclusivamente na gestão do meu corpo e na devoção da alma para aquela tarefa sobre-humana que lhes estava a ser imposta. Volvidas 9h49m da partida estava a cortar a meta em Cuidad de Cólon nos arredores de San José (Capital da Costa Rica), terminado a etapa rainha num honroso 109º lugar. Afinal tinham sido ´´apenas´´ 110km e não os 130km anunciados. Mas o acumulado, esse sim la estava todo, 4079 metros.
Ainda hoje não sei como fiz o resto desta primeira etapa, não me lembro de quase nada da segunda metade da etapa, acho que fiquei dormente de corpo e alma. Tenho lapsos de imagens de estar a comer enormes pedaços de papaia nos postos de abastecimento e de escarpas brutais de um lado e doutro do caminho, lamas e setas florescentes…
Cortei a meta e durante alguns minutos, vagueei por aquela zona sem saber onde estava ou o que fazia ali. Quando a Berta me encontrou no meio da multidão ainda estava com o capacete na cabeça e o pesado Camelback ás costas, não me lembrava onde tinha deixado a bicicleta.
Penso mesmo que só voltei a mim quando me pus debaixo de água fria. O Ricardo havia chegado há quase uma hora. Também para ele, a dureza deste dia tinha superado tudo nas nossas vidas no BTT. Esta prova merecia bem a fama atribuída.
Fiquei bem impressionado com a organização. Dispunha de uma área de meta bem apetrechada com pessoal para lavar bicicletas, refeição quente servida a todos os atletas, e nunca se formam filas. Oito postos de massagens de recuperação (pagava-se 13USD por vinte minutos) para os interessados, um camião TIR para transporte de bicicletas e autocarros para os atletas, etc…esperávamos pelo José Maria e pelo Quim, que chegaram mais tarde por esta ordem e com uma hora de intervalo. Estávamos no entanto muito felizes por todos termos superado a etapa dentro do controle horário.

2ª ETAPA- SAN JOSÉ – TURRIALBA

Quando acordei ás 4h da manhã do segundo dia de prova (para me preparar para uma partida programada ás 6h), não tinha a certeza se as minhas pernas iriam colaborar. Segundo a organização, este dia (de “descanso”) consistia numa subida dos 1000 para os 3000m de atitude no sopé do vulcão Irazú, e de uma descida daí para os 600m, nível a que a cidade de Turrialba em cujas encostas existe as grandes plantações de café da Costa Rica. A realidade foi no entanto bem diferente.No arranque ás 6h.45, já na periferia de San José, todos se mandaram para a frente de uma forma alucinante. Pensei que ou eu “estava nas lonas” ou então não eram os mesmos porque logo que a coisa empinou, lá estavam todos á minha volta e a gemer em coro. Primeiro em alcatrão, cada curva inclinava mais e mais, até já via a o preto do asfalto em frente como parede e não chão, ia em 20x32. Não me lembrava da ultima vez que isto me tinha acontecido em alcatrão! Estava esgotado, e todos a meu lado a desmontar. Eu pensava que a diferença estava no facto de eu ter uma pedaleira pequena de 20dentes e eles não, mas faço mais uma curva na estrada e a parede tornou-se mais vertical, não me restava senão levantar o rabo do selim e bombear os cranks em 1x1, numa pose ciclista nunca antes vista. No entanto era insuficiente e para não desmontar tive de recorrer á técnica de fazer ziguezagues atravessados na estrada. Depois passava a terra e a inclinação suavizou bastante. Num outro troço de subida, o caminho tinha sido levado pela chuvas e lá amarinhámos a “4 patas” pelo talude lateral para recuperar o escabroso caminho acima. A pedra imperava, e por alturas do CP1 estava toda a gente de novo apeada escorregando, 2 passos acima 1 abaixo, pés de lado para não escorregar e pingas de suor a bater impiedosamente no titânio do quadro da bicicleta. Estava sol mas não víamos o vulcão porque as nuvens cobriam a sua cúpula. A temperatura baixava á medida que se subia e olhei para o altímetro do GPS que dizia estarmos já a 2385m. Fiz as minhas contas e verifiquei que só me restava pouco mais de 600m de desnível para chegar ao Ponto mais alto do dia, depois seria tudo a descer. “Gosto deste tipo de provas que sobem tudo e desce tudo de uma vez só”, estava a sentir-me melhor, tinha encontrado o meu ritmo e o facto de estar continuamente a ultrapassar outros atletas dava-me muito alento. De súbito, numa curva da estrada á esquerda, uma seta verde florescente mandava-nos descer á direita! Não queria acreditar! Num ápice perdíamos altitude vertiginosamente, não sabia quanto, pois não podia tirar os olhos da descida para olhar para o GPS, mas o aumento rápido da temperatura que is sentindo na cara sabia que estávamos a baixar muito. Até que numa parte mais lisa olhei para o mostrador e vi 1450m de atitude, ou seja agora “toma, baralha e dá de novo”. Nesse momento percebi que não podia confiar mais nas informações da organização e o melhor era esperar sempre o pior. Sabia que tínhamos de passar dos 300m e lá fui resignado, passei pelo Ricardo na subida que me informou que a coisa não estava fácil para o lado dele, tinha as pernas muito doridas. Depois de mais umas descidas desmoralizantes, la chegávamos aos 3039m. La em cima no CP resolvi vestir o impermeável porque a organização me informou que não havia mais subidas. Arranquei desse CP no momento em que o Ricardo chegou, ele desce muito melhor que eu e rapidamente me apanharia nas descida.
Não tinham passado 5minutos e já estava parado a tirar o forro polar para evitar encharca-lo de suor na enorme subida que tinha pela frente. O GPS marcava 2740m de altitude e estava de novo a subir, mas para onde é que isto vai? A resposta só veio 45minutos de subida mais tarde, sobre um trilho de lama negra que só parou nos 3040m de altitude. Como já sabia, confiar nas informações da organização não poderia senão dar frustração portanto jurei a mim mesmo que a partir desse momento as interpretaria sempre como sendo desinformativas.
Quando no CP4 o controlador nos informou gratuitamente que seriam 30km sempre a descer até ao fi, pensei logo que vinha outra subida. 500m mais á frente la estavamos nós a subir outra vez. O Ricardo desmoralizou de vez e desmontou a até ao fim não voltei a ve-lo. Mas essa foi mesmo a ultima subida do dia. De repente, viramos á direita e os poucos cabelos que tenho até me fizeram levantar o capacete de arrepiados que ficaram so de olhar para a descida. Nunca uma descida me deu tão pouco prazer e tanta agonia. Verdade seja dita, nunca tinha descido uma encoste de um vulcão. A tão desejada descida transformou-se num purgatório. Não havia opções de melhor trajectória, era a descer a eito por cima das pedras. Os braços inchavam de dor, as mãos agarravam o guiador e os travões com tanta força que os dedos iam perder acção. “Tenho de parar”, gritava. E parei, mas não conseguia desmontar, tombei para o lado, estava trôpego, não sentia os braços e via tudo desfocado á minha volta e uma dor no cóccix que me inibia os movimentos de grande amplitude das pernas. Cinco minutos depois la estava de novo a montar a bicicleta..Cerrei os dentes e aguentei a dor..A pouco e pouco e á medida que fui descendo, o piso foi finalmente melhorando e nos últimos 7km desta descida de 32km foram feitos dentro de uma plantação de café por caminhos de muito bom piso permitindo velocidades alucinantes. Cortei a meta com 6h52 neste 2ª etapa que afinal tinha apenas 84km de extensão. O Ricardo chegou 25segundos depois. Acabamos ainda com sol e calor. Sorte essa que tiveram mais de metade dos atletas que chegaram depois de nós, quando começou a chover perto das 15h, e tiveram de gramar aquela tramada descida debaixo de chuva. O José Maria que já terminou depois das 15h, apareceu-nos completamente encharcado. O Quim terminou muito ensopado, já com o cair da noite, no entanto ainda com o Controle de chegada aberto. Congratulamo-nos todos por termos conseguido e continuar a competição.
Turrialba é uma cidade de media dimensão que não tem nada de especial a não ser a extraordinárias vistas para o vulcão.

3ª ETAPA – TURRIALBA-LIMON

Foi o dia de todas as surpresas. Dormi pouco nessa noite e mais um despertar ás 4h30 arrumou comigo definitivamente. Os jantares dos últimos dois dias não tinham sido grande coisa no que se refere a hidrato de carbono e sentia-me também por isso pior que nunca. As pernas quase não obedeciam á mente na hora de me sentar á borda da cama para me levantar. Mas nestas coisas de “quem corre por gosto não cansa” não há lugar a pieguices e ás 6h30 lá estávamos todos preparados para a partida. Primeira surpresa do dia: ninguém sabia bem ao certo onde era o local da partida. Era o caos instalado. Os 350 atletas stressados só arrancaram depois de muito penar, meia hora depois do previsto. Depois da grande confusão, apontámos para um dos lados e zás, com um grito de “buena ruta” que suou por cima das nossas cabeças, lá zarpamos nós subida acima. Não sei onde aqueles tipos foram arranjar tanta energia nas pernas? Eu parecia que estava parado! Sem forças para andar, a minha moral foi-se completamente abaixo, necessitava urgentemente de um detonador para o cérebro reagir. Olhava em frente e via o cordão colorido de ciclistas ao longo da subida, contrastando com o asfalto negro da estrada ladeada pelas enormes arvores verdes da floresta tropical. Era a subida que dava início à maior etapa da “La Ruta”: eram 160km com uma grande parte em plano, tal como fomos informados ou dizendo melhor, levados a acreditar.
Não esperei muito até que surgisse o tal detonador que me faltava. A meio desta subida passa por mim “crankando” fortemente o tal homem da “single-speed” e aí pensei na minha e o quanto gostava dela e das alegrias que ela me dava e resolvi simulá-la. Procurei, neste meu “multi-speed” gingarelho de agora , uma relação parecida com os seus 34x20 e tentei ir com ele. Ao principio foi doloroso, mas sem deslocar dele o animo cresceu, um pouco de gel para diluir na boca, um trago de água e eis-me a passar por ele na subida. “É tudo psicológico”, pensei. Comecei a ver o Ricardo lá á frente e isso ainda me animou ainda mais. Surpresa do dia: saía-se do alcatrão para a esquerda e uns quilómetros mais á frente na descida, tínhamos um monumental lamaçal a descer para o rio lá em baixo. Era uma lama muito mal cheirosa que nos fazia enterrar as pernas ate aos joelhos (não estou a exagerar). Quando passei finalmente o rio, foi sobre uma ponte suspensa, tipo Himalaias. Já do outro lado, retirei a camada de lama que tinha em cima do GPS que indicava uma altitude de 315m. Sabia que teria de passar aos 1500m, faltava portanto muito, já tínhamos estado aos 1100m e agora estava, inclusivamente, mais baixo que na partida.
O calor era intenso lá naquele vale, e a subida aí estava, mesmo na minha frente, impiedosa com as suas rampas de brutal inclinação. Estava “frito”, na subida sentia-me a desfalecer de novo, era obrigado a parar com frequência á sombra de uma arvore para recuperar um pouco, o sol estava abrasador, não conseguia nem progredir na relação 20x32. Estava de rastos, mais uma vez pensei em desistir e já nada me conseguia animar nem mesmo as mangueiradas de água fresca que alguns populares, com as suas casas á beira do caminho, me mandavam para cima e ate enfiavam dentro da blusa pelas cosas abaixo. Tinha passado quase uma hora naquela subida e olhava para a rabina á esquerda do caminho e ainda via o ria la muito em baixo. Estava derrotado. Se aquilo continuasse assim era já ali o meu fim na Ruta. Arrisquei em perguntar mais uma vez como seria daí para a frente, já sabia que me iam mentir, mas essas mentiras poderiam ser reconfortantes naquela altura e dar-me alguma esperança quando eu já não tinha nenhuma. Disseram-me “es llano por un ratito e despues es tudo de bajada”. Estive parado neste posto uns bons 15minutos, comi muita fruta e tomei bebidas isotonicas, recuperei a respiração e lá me montei na minha irreconhecível Atlas de tão suja que estava.
A descida lá veio finalmente, não antes de feito umas rampazitas bem inclinadas. Era uma velha estrada de alcatrão toda esburacada. Vi muitos encostados a remendar furos e fiquei por ter descido com cautela. A descida só parou junto ao mesmo rio que já tinha atravessado para aí umas duas horas antes. O altímetro dizia 340m. O caminho agora bordeava o rio na margem esquerda alternava com subidas e descidas ora em terra ora em alcatrão onde uma vez tive de levantar o rabo para pedalar em pé na relação 20x32, deveria ter seguramente mais de 23%. Havia muitas casas á beira do percurso e muita gente simpática festejava a nossa passagem e regava-nos com água. O vale do rio foi-se fechando. As altas montanhas estavam de novo muito perto e eu tinha de sair dali.”Qual será a encosta que vou ter de subir?”, pensei “Venha o diabo e escolha”. E o diabo escolheu bem, a subida era um demónio, pedra, pedra e mais pedra, calor, calor e mais calor tórrido. Tinha de desmontar, a minha roda da frente levitava a todo o sempre, não tinha mais mudanças e o peito estava quase a rebentar. Procurei uma sombra e sentei-me. Isto é de loucos, pensei, mais vale que nos ponham a todos encostados á parede em frente a esquadrão de fuzilamento e arrumar com isto de vez.
Imaginei os conquistadores Espanhóis há cinco séculos atrás a fazerem a esta rota para ligar o Pacifico ao Atlântico e como seriam mais duras as adversidades..Portanto “deixa-te de lamurias e monta” disse para mim mesmo. Lá fui. De súbito já lá no alto olhei em frente e pela primeira vez que tinha chegado á Costa Rica não via mais montanhas, tudo era uma imensa planície a perder de vista. Estava já a descer por uma boa estrada de alcatrão, uma enorme recta que mergulhava na planície lá em baixo e passava por muitos lugares povoados. Foram uns bons 10km a descer sempre em frente. Agora sim, senti o final ao meu alcance e animei-me de novo.
De repente, vem outra surpresa, uma seta verde manda-nos para fora de estrada e para cima de uma linha-férrea. Ao principio até achei engraçado, este desvio provou ser uma necessidade pois havia que passar um grande rio e isso foi feito sobre a ponte de caminho de ferro saltando de sulipa de madeira em sulipa. Olhando pelos intervalos as águas barrentas do rio lá muito em baixo. Esta cena repetiu-se muitas vezes. Algumas, dessas pontes eram bem altas e compridas (havia uma com uns bons 800metros), não podia haver deslizes, os rios lá em baixo estão infestados de crocodilos! No entanto tínhamos já mais de 80km nas pernas e o cansaço atrapalhava a concentração, algumas traves estavam mais afastadas e era preciso dar um salto maior, não podia haver falhas.
Finalmente chegamos a uma estrada asfaltada, a N32, a melhor estrada da Costa Rica, que embora fosse considerada auto-estrada e tivesse portagens, só tinha uma via para cada lado, cruzamentos, ausência de separador central, semáforos e claro bicicletas podem circular á vontade.
Entrei na estrada e li uma placa que dizia “Limon 41”. Era aí que seria a meta. Estava inserido num grupo de 10 atletas e formamos um pelotão para nos entre ajudarmos. Recuperei o ânimo e as energia ao ponto de ir quase sempre eu á frente a puxar. Fizemos 20km desta maravilha. Fomos informados do CP4 que faltariam 35km para o final.” Então se la trás faltavam 41 e fizemos 20?!”
Dei por mim a pedalar, com este grupo de 10 companheiros de aventura, num bom estradão e a tentar manter aquele ritmo. Foi aqui que cometi o maior erro da minha vida, rebentei com as poucas energias que ainda tinha. E quando cheguei á ultima surpresa do dia, não tinha mais nada em mim, estava de novo a bater no zero e pela minha frente uma linha férrea de 12km para fazer entre carris! Voltei a saltar de sulipa em sulipa para negociar aquelas passagens de rio encima das pontes da linha férrea. A trepidação foi demolidora! Ultrapassei ciclistas parados, sentados nos carris em completa agonia. A dor era tanta que não sentia os antebraços e as mãos, os triceps doíam-me fortemente e todo o meu esqueleto agonizava, aquilo era demais, tinha de parar, sabia que se andasse mais devagar era pior, mas manter a velocidade era sobre humano. As lágrimas jorram-me os olhos, entrei em pranto convulsivo e tive de parar. Não me sustinha em pé, caí sobre o carril esquerdo e dei por mim a pensar em que mais os organizadores teriam para nos aniquilar definitivamente.
Mais á frente, vi ao longe dois populares, á beira da linha. Parei e atrevi-me a perguntar quanto mais teria de andar sobre aquela linha que me estava a comer vivo. Disseram-me “unos 400metros y en la orita usted en la carretera”. Claro que não acreditei e preparei-me para muito mais, mas pela primeira vez na Costa Rica, aquela informação não foi “mais xo menos”, era precisa e 400metros passados lá estava no CP5 e ultimo dia dar Ruta, mesmo ali á beira da linha. Cheguei transfigurado, prostrei-me no chão e enterrei a cabeça entre os joelhos e pedia a Deus que não nos mandasse mais para aquela linha. Estive 10minutos parado nesta posição ate recuperar uma forma de pensar mais lúcida. Levantei-me comi uma fatia de papaia. Ouvi um barulho familiar e olhei para trás e eram as ondas do mar. Era o Oceano Atlântico mesmo ali ao pé de mim. O barulho do mar sobrepôs-se a tudo e finalmente encaixei a realidade que estava a chegar ao fim da prova. Foram mais 19km por um caminho paralelo ao mar e muito pedregoso. Era como uma auto-estrada em comparação com linha-férrea que tínhamos saído. Não aguentava mais porrada. Queria chegar com a força, passei e fui passado por outros ciclistas. No rosto deles estava espelhado tudo o que eu sentia e queria, traziam no rosto a vontade de acabar e nas pernas o desejo de parar. Arrastei-me (é o termo) até que o caminho finalmente chegava ao asfalto. Sobre o recorte da encosta avistei a cidade de Limon e fiquei emocionado. Um espectador grita-me “2km para el final”. O alcatrão sabia como uma daquelas deliciosas sobremesas de “brownie” com cobertura de chocolate quente, depois de um prato mal cozinhado e insípido. A felicidade inundava-me a alma. Após uma ligeira subida no alcatrão la estava a saída á esquerda para virar para a praia onde terminava a La Ruta de Los Conquistadores”. Cruzei a meta e ali mesmo, em frente ás ondas do mar que também banham o meu Portugal longínquo. Caí em pranto num misto de dor e felicidade. Tinha conseguido fazer a prova mais dura do mundo. Aquela que todos os atletas mais batidos e que já fizeram todas, eram unânimes em dizer considerar como a mais difícil. Nunca antes na minha vida tinha feito algo tão duro e exigente fisicamente e mentalmente. As emoções explodiam dentro de mim numa mescla de insanidade e prazer. Sentei-me na areia e voltei a enfiar a cabeça nas pernas e chorei. A Berta pos a mão no meu ombro e acarinhou-me sem dizer uma palavra. Fui ate ao mar e mergulhei nas aguas tépidas e senti-me melhor. O Ricardo já tinha chegado havia meia hora. Concordava comigo por inteiro na apreciação da etapa e da prova. Mais tarde, chegou o José Maria e não precisou de dizer nada, o seu semblante dizia tudo. O Quim chegou já caía a noite mas ainda dentro do tempo regulamentar. Tínhamos todos conseguido! A prestação dos primeiros portugueses nesta prova saldava-se pelo sucesso absoluto! Estávamos finalmente eufóricos.
Nas classificações finais da prova constavam: 80º Ricardo Melo, 107º António Malvar, 159º José Maria Dias da Cunha e 255º Joaquim Pinto Lima.
Mais tarde alguém me perguntava: “Voltarias a fazer esta prova?” A minha rápida resposta, “NÃO”! Adeus Costa Rica!
António Malvar


In Bike Magazine nº 82 de Janeiro de 2004

Agradecimento a António Malvar pela publicação desta reportagem.
 

PedroSilva

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Inveja de voces?!? naaa hehe

vai correr tudo bem.. perninhas nao faltam! agora é so sofrimento psicologico!!! uma boa tecnica é colarem-se ao Frisc. e nunca mais o largarem!! :D hehe

Boa sorte pros dois novos herois tugas!! e vai correr tudo bem!:D
abraço
 

Hetfield

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Vi uma reportagem acerca desta prova na SoloBici aqui há uns meses. Aquilo não é mesmo pêra doce, ainda para mais o ano passado choveu e aquilo era lama por tudo quanto era lado, o que tornou tudo ainda mais difícil para os participantes.

Desejo a melhor das sortes para os nossos representantes e que tudo lhes corra pelo melhor.

Quanto a ter inveja deles... Eu assumo que tenho (no bom sentido claro). :wink:
 

Alf

Active Member
Ora bem, vou mandar os meus 5 centimos.

Não era eu que me metia nisso. Pronto está tudo dito :mrgreen: :mrgreen: :mrgreen:

Fora de brinadeiras, queria desejar a maior sorte a estes dois "malucos", que já sabem que podem contar com o nosso apoio, moral, é claro.

E pronto, não atropelem anacondas nem crocodilos... atropelem antes as metas das três etapas, que isso é que é importante.

BOA SORTE!!!
 

BigFoot

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Confesso que me mete muita impressao.. mas aquilo é que e vontande e muita coragem.. porque se ja e dificil uma pessoa "normal", sem uma perna ainda e muito mais.. Para mim o verdadeiro vencedor é aquele que supera as maiores dificuldades.. e este demonstrou o que é espirito de sacrificio e empenho..
é verdade ipsferreira... pequeninos e pouco.. minuscolos! ainda dizemos nos que subimos descemos bla bla bla..

Card050 e João força ai!!

Quem me dera um dia ter um grande prazer de vos acompanhar! de inicio ao fim! :mrgreen:

Cumps.

Bruno Atalaia
 

José Martins

Administrator
Tanbém gostava de ter o prazer de vos acompanhar, mas acho que era mesmo no carro de apoio :mrgreen: :mrgreen:.
Passando para a parte séria, que tudo vos corra de feição, certamente que vão dar o máximo e que no final, tragam a mente cheia de recordações espectaculares e com a sensação de que valeu a pena.

Felicidades.
 

OBiklas

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nem sei o que dizer...
tenham muito força interior e exterior, e não se esqueçam que a malta da vossa terra vos apoia mesmo estando distantes...o mais importante é chegar ao fim.


FORÇA NAS PERNAS E NA MENTE!!
 

miguelromao

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no ano passado na 1 maratona festivalbike vi um companheiro sem um braço a fazer a maratona e achei fabuloso.mas depois deste video só posso ficar maravilhado e admirador de BRELT WOLFE
 

silvioferraz

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Parabens desde já aos dois gandas malucos. Ao Aldo que já tive o prazer de conhecer, aquele abraço e partam a louça toda.

Boa sorte campeões
 

João Marinho

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Ja começamos a delirar...

COSTA RICA


Costa Rica é um pequeno país da América Central, com uma exuberante beleza natural, banhada pelos oceanos Pacífico e Atlântico, repleta de florestas, praias, vulcões e parques nacionais. Estas condições fizeram com que nos últimos anos, seja um pólo de atracção para quem procuram um contrato directo e profundo com a natureza. Os BTTistas incluem-se neste grupo provenientes de diversos cantos do planeta para experimentar e desbravar os trilhos tropicais aí existentes.
A Costa Rica tem extensões intactas de florestas tropicais, por isso os índices pluviométricos são assombrosos. Culturas de café e cana-de-açúcar espalham-se por todo o centro montanhoso do país. Há ainda regiões alagadas, cheias de aves, crocodilos e outros animais.
A Costa Rica tem apenas 51 mil km ² de terras, a maior parte de seus habitantes vive no campo, e a população da maior cidade é San José, em torno de 100 mil habitantes. Esta república verde, chuvosa e alegre há muito encanta o mundo com suas lições de consciência ecológica. Só para se ter ideia, hoje, ¼ de todo o território está protegido por algum tipo de reserva, inclusive particular, e 12 % deles como parque nacional, com normas rigorosas de manutenção.
As montanhas que cortam o país também isolam dois mundos distintos por apenas 125km, no ponto mais largo, as águas do Atlântico e do Pacífico banham a pequena Costa Rica. No lado do pacífico o país é mais desenvolvido, já o lado do Atlântico é tipicamente caribenho.

A COMPETIÇÃO


O cenário de relevo verdejante, montanhoso, tropical e de muitos vulcões sugerem trilhos inesquecíveis, um verdadeiro paraíso para BTT. Aproveitando esse facto, e inspirado na rota dos primeiros conquistadores espanhóis, Román Urbina, psicólogo de 30 anos que abandonou o consultório para se dedicar a causas ecológicas e desportivas, traçou uma rota, para ser percorrida de bicicleta, que saia do Pacífico para três dias depois terminar numa praia do Oceano Atlântico, num percurso de quase 400km.
Esta é a mesma viagem que, em 1540, os conquistadores espanhóis, liderados por Juan De Caballón, levaram 20 anos para atravessar a Costa Rica de costa a costa.
Este percurso resultou também em uma das mais difíceis competições de BTT do planeta, La ruta de Los Conquistadores ou simplesmente La Ruta
La Ruta iniciou-se há 14 anos, não como uma competição, mas como uma expedição, cujo objectivo era contemplar a grandeza dos tesouros naturais deste belo país que é a Costa Rica. Desde então, esta ideia foi mudando tornando-se uma sensacional competição internacional de BTT
A prova consiste em atravessar florestas tropicais, grandes montanhas, vulcões e muitos outros desafios nos mais diferentes terrenos – asfalto, terra, areia, areia vulcânica – ou melhor, em todo tipo de terreno. Os participantes passam por nove dos doze micro climas diferentes da Costa Rica.
La Ruta coloca á prova as capacidades técnicas para manobrar uma BTT, resistência, força física e psicológica e principalmente a durabilidade do equipamento.
La Ruta não é um evento para qualquer um. Além de uma excelente preparação física, cada participante deve ter muita paciência, pois as dificuldades são extremas e os momentos de tensão e frustração devem ser deixados para trás.
La Ruta é mais que uma competição, é uma experiência de superação pessoal, um desafio. O mais importante não é ganhar ou percorrer em um tempo recorde, mas sim passar por uma experiência diferente, como uma conquista pessoal e conquistar e ajudar novos amigos ao longo do trajecto.


 
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